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segunda-feira, 16 de março de 2020

No Segredo dos Deuses


No Segredo dos Deuses
(Notas da entrevista de Alexandre de Marenches a Christine Ockrant em 1986)
 
A II Guerra Mundial:
   Preocupado com a crescente concentração de poderes nas mãos de Hitler e com o pedantismo irrealista dos responsáveis da defesa francesa - ainda empolgados com o desfecho da I GM, os políticos e militares franceses julgavam o seu exército capaz de manter invioláveis as suas fronteiras, revelando total desconhecimento do “estado da arte” das forças alemãs.
  Durante a ocupação da França, Alexandre de Marenches, viria a testemunhar, estarrecido, o degradante espetáculo das denúncias dos seus compatriotas ao ocupante. Terminada a guerra, de regresso a França ao lado do marechal Juin, o ex-combatente aristocrático, descobriu, com grande surpresa, quarenta e dois milhões de “resistentes”! De falsos resistentes. Traidores que se afirmavam patriotas tal como por cá depois do 25 de abril de 1974.
   Este livro, entre outras coisas, descreve o bulício militar que se vivia em Argel, onde se cruzavam as forças aliadas e fervilhavam as intrigas, bem como o corpo expedicionário sob comando do marechal Juin. Este era composto por cerca de cento e trinta mil homens, dos quais, cerca de cem mil, indígenas do “ultramar” - berberes, cabilas, pieds-noirs, tabores marroquinos - e pela 1ª divisão francesa livre, composta por unidades oriundas do império francês; taitianos e gente das feitorias da Índia. Ben Bella, futuro Presidente da Argélia, integrou este corpo expedicionário acabando distinguido enquanto ajudante de atiradores. Para as forças armadas francesas, estava em causa desfazer o trauma da vergonhosa debandada de quarenta após colapso da célebre “linha Maginot. Durante a ocupação, o jovem Alexandre de Marenches - 20 anos -, determinado a não cair nas mãos dos ocupantes, fugiu para Madrid, atravessando os Pirinéus, sozinho e a pé.
   Entre o relato de episódios pitorescos ocorridos no teatro de guerra, Alexandre de Marenches dá conta da ingenuidade do Departamento de Estado americano - mandato de Roosvelt - ao confiar na boa-fé de Estaline na sequência dos acordos de Teerão em 43, proibindo os exércitos aliados de marcharem para leste, como pretendiam os seus chefes militares, prevendo a ameaça comunista.
   Graças a este equívoco os simpatizantes soviéticos infiltraram-se em departamentos estratégicos americanos, incluindo o círculo presidencial, onde obtiveram documentação classificada que lhes foi útil na posterior guerra de desinformação entre as duas potências que ficou conhecida por “guerra fria”.
   Na origem da boa vontade dos americanos para com Estaline esteve a intenção de arrefecimento da exigência deste aos aliados de abertura duma nova frente de combate a ocidente com vista a aliviar o esforço militar do exército russo. Roosevelt era o Presidente americano, Eisenhower o comandante supremo interaliado e George Marshall o estratega militar.
   Um dos episódios sinistros praticado pelos dirigentes soviéticos relatado consistiu no fuzilamento de dezenas de milhar de russos refugiados que se encontravam nas zonas ocupadas pelas forças americanas e inglesas e devolvidos à União Soviética - segundo refere Nicholas Bethell no seu livro The Last Secret, teriam sido cerca de 2 milhões; uma sentença de morte a que muitos tentavam escapar preferindo atirar-se dos comboios em movimento contra as redes de arame farpado eletrificado.
   Consequência da desagregação institucional na França liberta os comunistas tomaram o poder nos núcleos de Resistência, caso de Limoges, constituindo governos locais semelhantes aos famosos “sovietes” da Revolução de 1917. Impossibilitado de impor a ordem por falta de efetivos militares devido à recusa de cedência por parte de Eisenhower, De Gaulle, acabou por fazer concessões aos comunistas franceses, integrando alguns deles no seu governo e amnistiando Maurice Thorez, desertor célebre.
   Estaline, de origem camponesa e ex-seminarista, adepto dos métodos de Sun Tzu, é descrito como antigo terrorista, patrão do Kominform e do Komintern, responsável pela morte de milhões de pessoas. Intrujão, explorava a credibilidade dos seus interlocutores, simulando cordialidade, tolerância e solidariedade.
      A Administração americana intercedeu no espaço público favoravelmente ao regime soviético tornando-o simpático aos seus cidadãos. Truman, que sucedeu a Roosevelt e que contava entre os seus colaboradores próximos um tal Joseph Davies, amigo de Estaline desde os seus tempos de embaixador dos EUA em Moscovo, fez vista grossa à anexação de Konigsberg e parte da Prússia oriental, tal como fizera Churchil. Paradoxal!
   Tudo isto levou Alexandre de Marenches a considerar que, apesar de terem vencido o nazismo, os Aliados perderam a guerra para outro sistema totalitário, o fascismo vermelho­­­­; o cancro marxista espalhara-se pelo mundo. Ficou a dever-se à ingenuidade de Truman e Marshall a ocupação da Europa de Leste pela URSS.
   Vinculados aos acordos de Teerão, Yalta e Potsdam, os chefes Aliados Ocidentais acreditaram que o mesmo ocorria com Estaline. Enganaram-se! Caiu a “cortina de ferro” sobre milhões de europeus, a URSS passou a ter três votos na ONU enquanto os EUA mantinham apenas um. E, se é verdade que muitos “cérebros” nazis foram recrutados pelos Aliados, muitos mais foram engordar os quadros da URSS.




Peniche, 14 de Março de 2020
António Barreto

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