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Olhando Para Dentro (notas)

Olhando Para Dentro 1930-1960 (Bruno Cardoso Reis) (Em História Política Contemporânea, Portugal 1808-2000, Maphre - nota...

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domingo, 30 de dezembro de 2018

Ascensão de Salazar (Os Anos de Salazar, Volume 1, notas 1)


Do Acto Colonial:

   …Criava-se o estatuto de direitos e deveres dos “indígenas”, que incluía a proibição do “trabalho obrigatório”, e eram reconhecidos direitos às missões católicas portuguesas.

Do Estado:

   …Deve o Estado ser tão forte que não precise de ser violento….O regime será autoritário e presidencial.

   A fonte de soberania não é o “cidadão”, mas a “célula social irredutível” que é a família, “núcleo originário da freguesia, do município”. Seguem-se as corporações, que representam “interesses legítimos a integrar nos da coletividade”.

   Rejeita-se a democracia, que foi operando o “nivelamento em baixo, contra o facto das desigualdades naturais, contra a legítima e necessária hierarquia dos valores numa sociedade bem ordenada”.

Da influência religiosa de Salazar:

   Na encíclica Diuturnum do Papa Leão XIII, refutava-se a ideia de que a legitimidade do poder civil e político proviesse do povo. Rejeitava-se o Contrato Social de Rousseau e afirmava-se a necessidade de um chefe para cada grupo de homens.

   A encíclica Libertas declara que a liberdade de expressão e de imprensa não constituem um direito.

   Já a encíclica Sapientiae Christianae defendia o amor extremoso dos cristãos à terra que os viu nascer e crescer, prontos a defendê-la, e o dever de militância política, “disciplinados” ao papa e aos bispos. ..A igreja não segue partidos políticos, mas aprova qualquer sistema de governo, desde que respeite a religião e a moral cristã.

   Na  Rerum Novarum  a igreja insurgiu-se contra o socialismo e o comunismo, contra a luta de classes e do recurso à greve, defendendo a reconciliação entre patrões e empregados nas corporações servindo e Estado de moderador.

   A Inimica Vis condena expressamente a maçonaria.

   A Graves de Communi estabelece os princípios da Democracia cristã, consistindo no reconhecimento do direito de propriedade, na independência das formas de governo, alheamento dos partidos, conciliação entre as classes sociais como uma só família, obediência às ordens justas das autoridades condicionada à conformação destas às leis de Deus. Incentivava-se à beneficência, à previdência, e acção social que levasse a democracia cristã até ao povo.

   No Centro Académico da Democracia Cristã confraternizou com vários católicos notáveis, Mendes dos Remédios, Marnoco e Sousa, Sobral Cid e o jovem minhoto Manuel Gonçalves Cerejeira.

Da influência pagã:

   Charles Maurras, reacionário, na sua Action Francaise defendia o catolicismo enquanto instrumento político - independentemente da Fé - a monarquia antiliberal, a censura e a prevalência do Estado sobre todos os outros interesses.

   Salazar conclui o curso geral do liceu, primeira secção, em 1909, com 19 valores. Em 1914, aos 25 anos, o Conselho da Faculdade de Direito atribui-lhe a classificação final de 19 valores. Em 1916 candidata-se à docência na Universidade de Coimbra na área de Ciências económicas com um estudo intitulado “A Questão Cerealífera. O Trigo”. Em 1917 candidata-se a assistente na Faculdade de Direito e conclui uma dissertação com o título “O Ágio do Ouro, sua natureza e suas causas (1891-1915)” em que analisa a balança de pagamentos e as oscilações cambiais em Portugal, no período indicado.

   Em 1912, Salazar tem uma curiosa intervenção na sua primeira palestra em público na qual, citando Alexandre Herculano, defende a liberdade de pensamento e expressão, a importância da moral e da educação na questão social, o envolvimento útil dos cristãos na sociedade, critica o regime acusando-o de antidemocrático por ser anti-cristão, rematando com uma citação de Afonso Pena onde exprime o seu sentido da vida em “Deus, Pátria, Liberdade, Família”.

   Em 1921, contra sua vontade, Salazar, escolhido pelo Centro Católico Português, é eleito deputado por Guimarães, despedindo-se, logo na primeira sessão, de José Maria Braga da Cruz.

   Nas vésperas do 28 de Maio, em 1925, sucedem mais duas tentativas de golpe militar; uma liderada pelo general Sinel de Cordes, a seguinte, pelo comandante Mendes Cabeçadas.

   Então temos um Salazar ”marrão”; trabalhador, disciplinado, católico, corajoso e ambicioso, que, grato pelo apoio eclesiástico, confundiu catolicismo com cristianismo e declinou o seu conceito de liberdade para um confortável autoritarismo anticristão, subjugado à obsessão da ordem  e disciplina; uma espécie de efeito simétrico face à insanidade da entropia republicana que se vivia na época.

Créditos a António Simões do Paço

Peniche, 29 de Dezembro de 2018

António J. R. Barreto

domingo, 23 de dezembro de 2018

Adoração dos Reis Magos


Diago Velasquez, 1619
Adoração dos Reis Magos

Coletes Amarelos


   A manifestação dos “coletes amarelos em Portugal, para alívio do Presidente da República, Governo e partidos políticos, não teve grande impacto social, tendo sido até considerada, por alguns, um fiasco. Ignorar as causas desta manifestação seria persistir no isolamento da classe política face aos destinatários da sua ação, a população, adiando a inevitável rutura.

   Antes de mais este protesto emergiu por efeito de contágio do que tem ocorrido em França, com grande impacto político e económico no país, mas também na comunidade internacional, sobretudo no seio da União Europeia. A França atravessa uma crise social profunda resultante da conjugação do fenómeno, conjuntural, da imigração, e das consequências, estruturais, da crescente exigência de produtividade. A primeira lançou o caos na população, decorrente dos horrores dos atos de terrorismo islâmico de que tem sido vítima e da complacência das autoridades perante os seus autores. A segunda, provoca fenómenos de exclusão social através do exigente processo de rastreio de profissionais e empresas - a certificação -, de que resulta um crescente “exército” de excluídos dependentes da solidariedade pública.

   Em ambos os casos conclui-se que grande parte da população não se sente representada na matriz política atual dos respetivos regimes. Significa isto, que as dinâmicas partidárias foram perdendo o contacto com as bases, cristalizando-se em torno das correspondentes estruturas, estas, mais preocupadas com a o controlo do poder interno. No caso português, tal como referem José António Saraiva e Vicente Jorge Silva - no seu diálogo aqui anotado - o sistema partidário padece do pecado original que consistiu na importação de modelos externos em vez de emergir da realidade social do país. Isto mesmo pode ser confirmado hoje em dia pelas frequentes alusões à necessidade de mudar os portugueses; não apenas em termos culturais, mas também, literalmente.

   Os comentários de protagonistas e comentadores, com destaque para o Presidente da República, revelam que esta manifestação foi vista pela generalidade da comunidade política como uma espécie de plebiscito ao regime. Precipitadamente, concluíram que a fraca adesão significa que a grande maioria da população considera o regime apropriado e um baixo nível de insatisfação geral. No entanto, se tivermos em conta os sucessivos avisos - ameaças veladas de várias entidades - aos potenciais manifestantes, a dimensão do dispositivo policial convocado para o evento e as posteriores declarações de alívio, revela má consciência e medo. No fundo, sabem que a população tem razões de queixa.

   Aquele medo resulta da possibilidade de contaminação da decadência a que os partidos convencionais - do arco do poder - têm sido submetidos nas democracias ocidentais. Mas não só. Em pânico ficaram os partidos de protesto e respetivas centrais sindicais ao verem por mãos alheias uma prerrogativa - poder da rua - que julgavam exclusivamente sua - por direito revolucionário.

   A leitura a fazer, indesmentível, é que, os tradicionais partidos de protesto centram a sua ação, exclusivamente, na defesa dos interesses das corporações estatais induzindo o agravamento da carga fiscal à sociedade civil que, no fundo, abominam. Em consequência, os Coletes Amarelos são a manifestação deste abandono, duma lacuna que nasceu com a democracia e se tem alargado e aprofundado ao longo destes 44 anos, sem que se vislumbrem vestígios de regeneração (veja-se os recentes casos de sucessivas irregularidades cometidas, prepotentemente, pelos deputados e validados pela segunda figura do regime).

   Porém, apesar da fraca adesão, nada ficará como antes; os promotores da manifestação, tendo agido à margem dos partidos, tiveram a capacidade de organizar um evento de dimensão nacional, enquadrando-o adequadamente no domínio da segurança e prevenindo oportunismos extremistas.

  Nenhum governo deixará de ter em conta esta nova realidade na prossecução das suas políticas. Quanto aos partidos, necessariamente terão que rever o seu modelo de funcionamento sob pena de se tornarem irrelevantes e serem ultrapassados, como já aconteceu noutras paragens. Um tal cenário ocorrerá como consequência do extremismo economicista da União Europeia e da política de imigração em curso, decidida à revelia das populações, que ameaça a segurança destas e a sua própria cultura.

   A histórica solidariedade europeia para com os refugiados de guerra afro-asiáticos e o interesse na recuperação do défice demográfico europeu, estão contaminados por velhos e persistentes ressentimentos republicanos anticlericais internos e por estratégias, mais vastas, de combate ao capitalismo europeu por parte dos seus concorrentes além Atlântico e além dos Urais.

Peniche, 22 de Dezembro de 2018
António J. R. Barreto

O 25 de Abril visto da História (notas, P15)


O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais
 
Estas eleições surgem-nos como o encerramento legal do processo que se iniciou a 25 de Abril. A 27 de Junho fica reconstruída a legalidade…..(JAS)

   A legitimidade da legalidade coloca-se quando os poderes dominantes controlam o poder legislativo distorcendo a soberania popular em benefício próprio. (AB)

…A candidatura de Otelo representa ainda um terceiro projeto, diferente dos outros dois. Diferente em relação ao de Eanes, na medida em que não assenta em mecanismos de tipo representativo, segundo o modelo ocidental; diferente em relação ao de Pato, na medida em que não parte do pressuposto da necessidade prévia de conquistar o Estado por cima, antes insiste na necessidade de organizar em baixo, à margem do Estado, sem os olhos postos, à partida, na conquista do seu aparelho. Por isso, o projeto dos GDUP’s (e só falo do projeto) é precisamente isso: um antipartido…….a unidade de forças que se tornou possível com a candidatura de Otelo pulverizar-se-ia de imediato: a UDP para um lado, o MES para outro e a FSP para outro ainda – e assim por diante. (JAS)

   O modelo ocidental, que acabou, felizmente, por vingar com a vitória do General Ramalho Eanes, parece estar hoje numa crise de identidade indutora dum clima de total insegurança na população. O modelo de Pato continua em perigosa marcha com a tomada do aparelho estatal pelo PCP. Quanto à “democracia popular” de Otelo, uma utopia que o lançaria na criminosa aventura das FP25, tem hoje continuidade no BE, perigosamente próximo do poder. Por tudo isto, em 2018, vai ganhando corpo o sentimento geral de que as “democracias ocidentais” podem deixar de o ser a breve trecho. (AB)

….A lógica partidária, como decorrente que é dum certo tipo de relações e da Civilização que sobre elas se construiu, cairá inevitavelmente no momento em que a civilização burguesa for posta em causa nas suas próprias estruturas. (JAS)
 Foto: Praia das Figueira da Foz.
Peniche, 22 de Dezembro de 2018
António J. R. Barreto

domingo, 9 de dezembro de 2018

O 25 de Abril visto da História (notas, P14)



 O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais
 
 
…O primeiro dirigente político português a sugerir - indiretamente embora – a fórmula da “maioria de esquerda”, não foi Álvaro Cunhal, foi Mário Soares numa mesa-redonda na TV, depois de conhecidos os resultados das eleições de Abril de 1975. Demarcando-se com nitidez do PPD - que, no entanto, ultrapassa largamente o Partido Comunista em termos eleitorais -, Mário Soares preferiu colocar a tónica no peso maioritário da esquerda (facto que, aliás, se viria a refletir no conteúdo do texto constitucional, elaborado essencialmente com base na conjugação PS-PSD na Assembleia) …(VJS)
    Velhas cumplicidades dos tempos de Argel e da Frente Patriótica de Libertação Nacional. O resultado traduziu-se no PREC, na destruição do tecido económico e do capital, de que o país ainda padece. António Costa, “acossado” pela inesperada derrota eleitoral em 2015, recuperou este modelo reeditando o PREC em versão atualizada, optando pela satisfação das suas clientelas graças à inversão do ciclo económico e ao agravamento do endividamento e da carga fiscal, em vez de preparar o país para a inevitável crise futura. (AB)
 
….A posição de Melo Antunes a respeito do PCP, na sequência do 25 de Novembro, terá muito pouco - ou rigorosamente nada - que ver com a posição de Eanes sobre o mesmo assunto. Para Melo Antunes importava “recuperar” o PCP depois de lhe ter sido provada, em definitivo, a impossibilidade de levar por diante a sua tática golpista. Para Eanes - como para outros elementos militares - o que interessava era a marginalização do PCP….(VJS)
 
   Melo Antunes, comunista desde a juventude e principal mentor ideológico da insurreição de Abril e da desastrosa descolonização, detendo, à época, preponderância política, junto do “Grupo dos nove”, tratou de “salvar a pele” aos instigadores dos insurretos de Novembro - parte deles integrando atualmente o Bloco de Esquerda, nomeadamente a UDP nova designação dos dissidentes de 1964 do PCP, constituindo então a FAR, defensora da intervenção armada, a que aquele partido se opôs, e que em 75 concretizaram saindo derrotados - opondo-se à sua ilegalização. Quanto a Eanes, sendo, segundo VJS, pela marginalização do PCP - mas considerado por muitos como simpatizante deste partido, motivo do apoio do PSD ao General Soares Carneiro para as presidenciais em detrimento de Eanes a quem tinham apoiado anteriormente -, terá acabado por anuir à sua integração, eventualmente cedendo à tendência maioritária do Grupo dos nove.
 
…promulgada a nova constituição (elaborada num período em que a relação de forças ao nível do Poder pende claramente para o lado da esquerda, o que teria naturalmente reflexos no texto constitucional) passa a dar-se o contrário: o cumprimento da lei passa a ser uma reivindicação da esquerda (Vê-se o próprio deputado da UDP a exigir o cumprimento da lei…). …..Eanes, aparecendo como o homem (incorruptível) que faz cumprir a lei, torna-se naturalmente um aliado possível da esquerda (e em particular do PS, o partido mais responsável pela feitura da constituição)… (JAS)
   Talvez seja esta a razão de alguns atribuírem a Ramalho Eanes excessiva simpatia pela esquerda; PS e PCP. (AB)

….Para Eanes não existem classes com interesses distintos nem contradições no corpo social: existem, sim, a Nação, o País, a Salvação ou a Reconstrução Nacional.

    Por isso continua a ser respeitado pela generalidade dos portugueses e considerado o melhor Presidente da III República. A lealdade, a probidade e o espírito de missão são características irreconhecíveis no atual panorama político. O oportunismo, o nepotismo, a demagogia, a mentira descarada, fazem parte do dia-a-dia; uma espécie de novo tribalismo caracteriza o comportamento dos diretórios partidários, seus militantes e correligionários. O debate leal de ideias é a utopia das democracias. Estas transformaram-se numa caricatura de si próprias. Sem o “tempero” cultural adequado não há democracia. E esse “tempero”, para mim, são os valores cristãos, que, desde a Revolução francesa de 1789 têm vindo a ser substituídos, na Europa - em Portugal, a partir de 1934 -, pela doutrina maçónica. (AB)
Foto: Porto Novo

Peniche 10 de Dezembro de 2018
António J. R. Barreto

Aquecimento Global; a nova arma do socialismo


 
   Al Gore, baseado nos trabalhos de Michael Mann, Raymond Bradley e Malcom Hughes, realizados em 1999, na universidade de Columbia - de que resultou o famoso gráfico designado por hockey stick - assume tacitamente uma relação linear entre a concentração de CO2 e a temperatura global. Na verdade esta relação é logarítmica - com efeito marginal decrescente; o efeito térmico de um certo diferencial é menor que o efeito do mesmo diferencial que o precedeu. Por outro lado, as suas projeções da evolução da concentração de CO2 - 620 ppm em 2050 -, estão muito longe de virem a verificar-se. Desde 1977 que os teores de CO2 têm vindo a aumentar à razão de 1,5 ppm/ano; se a média dos últimos 30 anos se mantiver em 2050, a concentração de CO2 será de 446 ppm, tendo sido em 1987, de 348 ppm, muito longe do que preconiza Al Gore.  

   O hockey stick, de Mann, que serviu de base às recomendações do IPCC, foi elaborado com base num modelo matemático que Stephen McIntyre e Ross McKitrick, num trabalho publicado em 2003 na revista Energy and Environment, e, em 2005, na Geophysical Research Letters, demonstraram estar errado e ainda, que o ano mais quente do século XX terá sido o de 1934 e não o de 1978 como se pensava então. Gore, a partir de análises próxy aos 650 mil anos antecedentes da era pré-industrial - 1850 -, afirma que as concentrações de CO2 foram sempre inferiores às atuais - cerca de 380 ppm -, mas, segundo as análises próxy de Wagner at al - à densidade dos póros das folhas de bétula na Holanda -, estimou-se que, por exemplo, no período do Holoceno - período que decorreu desde o fim da última era glaciar há 11750 anos até 1800 -, durante séculos, as concentrações de CO2 ultrapassaram os 300 ppm, chegando a atingir os 348 ppm - idêntica à concentração medida em 1987. Noutros períodos mais recentes, ter-se-ão registado valores do mesmo tipo.

   Por outro lado, Gore, baseado no mesmo gráfico, procura induzir a ideia da relação de causalidade entre a concentração de CO2 e a temperatura global. Na realidade sucedeu o contrário; as variações de temperatura global precederam, de centenas de milhares de anos, as variações dos teores de CO2, segundo trabalhos de H. Fisher, M. Wahlen, J. Smith, D. Mastroianni e B. Deck; quando muito, as variações de CO2 tiveram um efeito amplificador nas variações térmicas em curso. O aumento do teor do CO2 na atmosfera deve-se ao aquecimento dos oceanos ao libertarem parte do CO2 dissolvido para a atmosfera - uma vez que a capacidade de absorção do CO2 diminuiu com o aumento de temperatura.  

   Em suma; o teor de CO2 tem aumentado à razão de 1 ppm/ano e tem um efeito marginal no aquecimento global - por exemplo; o aumento do teor de CO2 de 100 ppm provoca um efeito de aquecimento da ordem dos 2 W/m2 - um ganho de cerca de 0,2 %, já que a radiação solar média nas camadas superiores da atmosfera na normal aos raios solares é de, aproximadamente, 1000 W/m2 ; no passado pré-industrial - anterior a 1800 - verificaram-se teores de CO2 próximos dos atuais e temperaturas globais mais altas que as atuais. A evolução térmica média entre 1977 e 2006 foi de 0,17 ºC/década, sendo que, nos ultimos 20 anos, não se verificou variação assinalável - na verdade, ligeiro declínio, conforme medição por satélite iniciada em 1978.  

   O IPCC tem, ostensivamente, ignorado os trabalhos científicos contrários às teses de Mann e consta que terá proibido a análise de trabalhos publicados a partir de 2005. A minha convicção, fundamentada nas análises de; John Casey, Luis Carlos Molion, Rui Moura, Jorge Oliveira, Bjorn Lomborg, Marlo Lewis Jr, Stephen McIntyre, e outros, é que a teoria do Aquecimento Global é uma fraude, cuja finalidade é eminentemente política e multifacetada. Esgotadas as teses marxistas, os seus defensores, abraçaram a causa do ambiente como instrumento de combate ao capitalismo, em particular o americano. Por outro lado é uma nova forma de colonialismo na medida em que condiciona o desenvolvimento dos países pobres perpetuando a dependência destes relativamente os países tecnológicos, em especial, os do norte da Europa.  

   Finalmente, a consequente pressão para a redução de produção de recursos alimentares e outros bens - pescas, agricultura e indústria agroalimentar - tem como finalidade forçar pela fome a regressão demográfica, cuja prodigiosa expansão no século XX se deveu à Revolução Industrial e ao Capitalismo - ao proporcionar o aumento da produção alimentar em 8 vezes face ao aumento da população mundial em 6 vezes; de cerca de 1 bilião no início do século e para 6 biliões do final.  

   Por último, o Acordo de Paris preconiza, para os respetivos signatários, a tomada de medidas, com força de lei,  para a limitação do aumento térmico a 1,5 ºC em 2050. Este processo está em marcha em Portugal e está a dizimar a nossa produção agroalimentar que, nos próximos anos, ficará reduzida à marginalidade.  

Consultei; "A Ficção Científica de Al Gore" de Marlo Lewis Jr e "Calma" de Bjorn Lomborg.

Peniche, 9 de Dezembro de 2018
António J.R. Barreto

domingo, 2 de dezembro de 2018

O 25 de Abril Visto da História (notas P13)



 
O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais
 
 
….O 25 de Novembro, a meu ver, foi assim a ação desesperada de um punhado de oficiais empurrados para ela por dois “poderes”: de um lado, a “parte sã” do Exército – assumindo finalmente a sua coesão e isolando o “corpo estranho”, a “parte estragada”; do outro, o PCP – que lhes retira o apoio quando verifica que a sua própria situação se começa a tornar difícil e entra em “recuo tático”…(JAS)
 

   Diga-se, em abono da verdade que o PCP rejeitou, desde o início, ao recurso à via armada para combater o Estado Novo, tendo optado pela guerra de subversão. Tal provocou a cisão do partido com a criação da FAP cujos membros defendiam a intervenção armada. Quando, em 1963, MNI, PCP, MAR e ARS, constituíram a Frente Patriótica de Libertação Nacional liderada por Humberto Delgado, que, por divergência de métodos estratégico e orgânico,  a abandonou, fundando a Frente Portuguesa de Libertação Nacional com a qual pretendia desencadear uma intervenção armada em Portugal (após a “vitória moral” nas eleições de 1958, Humberto Delgado, considerava-se o líder incontestável da oposição, defendendo a luta armada contra o regime de Salazar, causas da dissidência com os restantes membros da FPLN). Quanto ao 25 de Novembro pensava eu que o PCP tinha sido o instigador da insurreição. JAS acha que não; perante os danos políticos provocados pela entropia que estava a induzir nas Forças Armadas o PCP “abandonou” taticamente os seus correligionários, os quais, em desespero de causa, quais párias, tentaram dar o salto em frente iniciando um golpe de Estado do qual saíram derrotados. (AB)

MNI: Movimento Nacional Independente (de Humberto Delgado)

MAR: Movimento de Acção Revolucionária (de Lopes Cardoso e Ramos Costa)

ARS: Acção Republicana e Socialista (de Mário Soares)

FAP, Frente de acção Popular (de João Pulido Valente) atual UDP: União Democrática Popular (de Mário Durval e João Pulido Valente)

…Na verdade, o 25 de Novembro significa, no plano político, a reconstituição do bloco cujas primeiras linhas de clivagem se dão a 28 de Setembro - daí que haja quem fale de um regresso ao “espírito do 25 de Abril”, isto é, de um regresso ao antes do 28 de Setembro….(JAS)

Percebe-se a ideia e, em parte, será verdade, no entanto, hoje, 43 anos depois, na Assembleia da República, celebra-se o 25 de Abril e não o 25 de novembro “para não ferir suscetibilidades”, o que quererá dizer que, de então para cá, de certo modo, terá havido um retrocesso ao 28 de Setembro; os derrotados de Novembro regressaram em 2015, e isso tem um significado nada lisonjeiro para o tipo de democracia que se constituiu. (AB)
 
Praia de Buarcos: autor desconhecido
 
Peniche, 2 de Dezembro de 2018
António J. R Barreto

domingo, 25 de novembro de 2018

Jaime Neves e o 25 de Novembro


     
   Eanes, o homem que gosta das pessoas e suscita lealdades, é o chefe do Comando Operacional do 25 de Novembro. Neves é o chefe operacional.

      Graças ao DL 577-A/75, do Governo de Pinheiro de Azevedo, Jaime Neves integrou no Regimento de Comandos da Amadora (RCA), onde predominam oficiais do curso de 53/57 da Academia Militar, cerca de 300 veteranos constituindo duas companhias; uma sob comando de Sousa Gonçalves - da 2ªCCMDS - a outra comandada por Sampaio Faria - da 3ª CCMDS. Na reserva ficaram outras duas.
      Concentrando o ódio da esquerda totalitária, em especial do MRPP, o RCA é alvo de ataques da RTP e da EN bem como de frequentes manifestações junto ao quartel, chegando a Somague a tentar impedir a saída de viaturas. Militarmente isolados na grande Lisboa, o RCA conta com o apoio de ex-comandos fortemente organizados e espalhados pelo país, bem como do apoio político de Pires Veloso, do Cónego Melo, do Partido Socialista e da Igreja. No plano operacional, o RCA conta com quatro companhias no Norte; Braga, Vila Real, Lamego e Porto; duas do Centro e o Regimento de Cavalaria de Estremoz - o regimento de Spínola. O maior apoio porém é o que sentem por parte da designada maioria silenciosa.
      A Ordem de Operações, uma guerra civil, segundo o seu autor, Ramalho Eanes, é apresentada por este, acompanhado por Rocha Vieira, ao General Costa Gomes. Na ausência de Eanes, a planeada distribuição de armas é efetuada principalmente ao Partido Socialista através de Edmundo Pedro e Manuel Alegre por Galvão de Figueiredo, sob ordem de Tomé Pinto, tendo Eanes assumido a responsabilidade enquanto chefe do Comando Operacional.
      Os principais objetivos dos militares democratas são; o quartel da força aérea de Monsanto, a Polícia Militar e outros na calçada da ajuda, o COPCON no Forte do Alto Duque em Belém, e os paraquedistas de Tancos. A unidade de Monsanto não ofereceu resistência aos homens de Neves. Foi na Calçada da Ajuda que os cerca de trezentos comandos, agrupados em três companhias, enfrentam mais de dois mil militares; a de Jaime Neves, acabado de ser promovido a tenente-coronel, que sobe a calçada de chaimite, a 113ª do capitão Manuel Apolinário, que entra na calçada pelo lado esquerdo, e a 112ª do capitão António Lourenço, que desce a calçada.
      Pelas oito horas do dia 26 de Novembro, a chaimite de Neves, onde vão Ribeiro da Fonseca, Arnaldo Cruz e Vitor Ribeiro, inicia a progressão na Calçada da Ajuda, rebentando subitamente sobre ela uma trovoada de tiros vindos de todos os lados; do quartel e das casas particulares à esquerda. Há confusão de gritos, tiros e correrias, Neves, com meio corpo de fora da viatura, via rádio, dá ordens aos seus homens para não responderem ao fogo. José Eduardo Oliveira Coimbra vindo do cimo da calçada com a 112ª é atingido em cheio na crossa da aorta, acabando por morrer no Hospital Militar de Infectocontagiosas. Na CCMDS 113ª o furriel Joaquim dos Santos Pires é morto pelo fogo de metralhadora proveniente do Regimento de Cavalaria 7, frente ao quartel da Polícia Militar. Obedecendo à ordem de contenção, os comandos cercam o quartel da PM conseguindo posição de domínio. Do lado contrário é morto o aspirante Ascenso Bagagem. Neves avança de chaimite e derruba o portão de Lanceiros 2, tomando o quartel sem um tiro. Na frente da formatura na parada dos militares derrotados ordenada por Jaime Neves está Mário Tomé, que revelou honra na derrota. Quanto ao comandante da unidade, que revelara grande bravura na Guiné, ter-se-á refugiado debaixo de uma secretária, segundo Tomé. Ás três horas termina a operação, seguindo-se a passagem de passaportes aos militares derrotados, tendo ficado no comando do quartel da Polícia Militar, o bracarense Jaime Abreu Cardoso, figura lendária entre os comandos.
      Ao terceiro dia, a 112ª Companhia de Comandos cerca o Forte do Alto do Duque com o objetivo de prender Otelo e todo o Copcon. Mas foi Eanes que, surgindo com um grupo armado, levou Otelo, recusando-se a prendê-lo, contrariamente à exigência deste. No quartel apenas havia alguns fuzileiros, que incitavam à acção, e alguns oficiais. 
     
A maior preocupação porém era com a sublevada tropa especial de paraquedistas de Tancos, liderados pelo major Mascarenhas Pessoa, dos quais se esperava forte reação. Tal não viria a ocorrer graças a uma inteligente manobra administrativa do Chefe de Estado Maior da Força Aérea, general graduado Morais e Silva que proíbe o fornecimento de alimentação, atribuição de verbas e qualquer tipo de apoio aos militares sublevados, desmoralizando-os, até porque boa parte deles são instruendos. A recusa de apoio aos paraquedistas por parte de Heitor Almendra, a alma mater dos paras, conterrâneo e amigo de Neves, acabado de regressar de Angola com centenas de paraquedistas, que despreza Mascarenhas pessoa, desativaria em definitivo a sublevação dos boinas verdes.

      Ao fim de quatro dias, os principais suportes militares do PREC estão dominados e Jaime Neves, com os pés em chaga, pode então descalçar as botas e caminhar para a posteridade.
      Para Jaime Neves, o 25 de Novembro foi um contragolpe na extrema-esquerda e nos comunistas de Cunhal. Porém, a fragilidade de oposição do PCP alimenta a suposição de que a principal intenção de Cunhal, Pato, Lourenço e companhia, consistia na entrega das províncias ultramarinas à órbita soviética através do “internacionalismo proletário”. Angola, com as manobras de Rosa Coutinho, a independência e o MPLA no poder duas semanas antes do 25 de Novembro parece comprová-lo.
     
Duas das consequências do 25 de Novembro foram o fim da oclocracia e a eleição de Ramalho Eanes para a Presidência da República; o primeiro democraticamente eleito, com o apoio de Jaime Neves, que participa na sua campanha. Este não tem apetência pela atividade política e recusa-a, considerando os políticos, tal como Torga - seu conterrâneo - “papagaios insinceros”. Confia na intransigência da defesa da democracia do seu amigo e camarada Eanes, cujo caráter conhece, por isso o apoia.


      Formalmente, é o “Documento dos Nove”, elaborado por Melo Antunes, considerado por Ramalho Eanes e muitos outros “ o pai da Democracia em Portugal” que põe termo ao PREC. Um documento que evita a aniquilação do PCP constituindo simultaneamente um aviso à extrema-direita. Jaime Neves, contrariamente ao que foi difundido, não quer “dar cabo” do PCP nem da Intersindical, não se coibindo porém de criticar ambos. Apesar de tudo, Neves não está satisfeito; quer deitar a mão aos lideres do PREC e “no mínimo, expulsá-los de Portugal”, nunca, encostá-los ao “paredón”.
     
Efetuadas as comoventes honras militares aos falecidos furriel Pires e tenente Coimbra, os seus funerais são sentidos pelo Povo. No de José Coimbra, tripeiro da rua de Santo Ildefonso, milhares de pessoas inundaram a ponte D. Luis, que parece ter tremido com a carga humana. Jaime Neves fica com a sua kalashnikof.

Sintetizado de "Jaime Neves, Homem de Guerra e Boémio" da autoria de Rui Azevedo Teixeira, editado pela Bertrand 

Peniche, 25 de Novembro de 2018
António J. R. Barreto   

sábado, 17 de novembro de 2018

O 25 de Abril visto da História (notas, P12)


O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais
 
…os processos conspirativos de tomada do poder ou a atividade política como atividade conspirativa como atividade política dominante são característicos de países em que o peso do Estado é preponderante face à debilidade da sociedade civil. (VJS)

   Quarenta e quatro anos depois do fim da “longa noite fascista” o Estado foi tomado pelos Partidos, que mantêm a sociedade civil em estado “vegetativo”, esta, subsistindo perante a voracidade fiscal e patrimonial dos novos “senhores” - herdeiros dos velhos privilégios da extinta nobreza e do esclerosado clero. (AB)

…Em segundo lugar, temos a natureza tipicamente pequeno-burguesa do Movimento dos Capitães, que o expôs, necessariamente, às mais diversas e contraditórias flutuações, culminando, por fim, na desintegração do MFA…(VJS)

   O MFA refletia as contradições da sociedade civil, de onde, afinal, provinham os seus membros. Por essa altura, uma sociedade “partida ao meio”, correspondendo quase completamente a duas zonas geográficas distintas, com duas histórias de povoamento distintas e com padrões económicos distintos. Até hoje, o 25 de Abril deixou um país fraturado, economicamente indigente. (AB)

…Disso se apercebe claramente o PS, ao tomar a dianteira da ofensiva contra o gonçalvismo e ao capitalizar em proveito próprio toda essa vaga imensa de frustrações explosivamente acumuladas…(VJS)

Pensava-se então que o socialismo do PS não tinha correspondência com a doutrina marxista, muito menos com o modelo leninista que o PCP estava a levar ao terreno, numa vaga de terror de sentido contrário ao “fascismo” antecedente. A realidade de hoje confirma tese de muitos de então - como Rui Mateus -, segundo a qual, estaria em causa, não o marxismo-leninismo do PCP, mas a liderança do processo. E o gradualismo reformista  do mesmo, digo eu; para não assustar os eleitores. (AB)

….A estrutura hierárquica do partido corresponde organicamente à estrutura hierárquica do exército: daí à osmose vai um passo. E daí que seja uma explicação moralista primária o dizer-se que certos oficiais, bem conhecidos pelas funções destacadas que desempenharam no decurso da guerra colonial, se converteram por mero oportunismo em instrumento do PCP ou da extrema-esquerda. O que acontece é que, face à crise de identidade em que o exército de debate com o fim das guerras coloniais, as únicas alternativas ideológicas que então se apresentam para preencher o vazio são as do PCP e de certa extrema-esquerda. (VJS)

   VJS não refere casos pessoais, mas talvez Costa Gomes tenha sido um desses casos, quanto aos mais conhecidos; Melo Antunes, Rosa Coutinho, Vitor Crespo…,tenho ideia que terão sido opções ideológicas muito anteriores ao 25/04. (AB)
Foto: Marginal Norte
Peniche, 17 de Novembro de 2018
António J.R..Barreto

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

O 25 de Abril visto da História (notas P 11)


…Esta situação, o 11 de Março, atingiria o seu ponto mais alto. Aí, ao tomar, praticamente sozinho, o controlo da máquina do Estado, o Partido Comunista assinava a sua própria sentença de morte, a médio prazo, como partido de governo…. (JAS)

   Mas ficou a semente. Até hoje. E foi o suficiente para entregarem as províncias ultramarinas à União Soviética.(AB)

…O Partido Socialista começa, diretamente, através do seu secretário-geral Mário Soares, por desempenhar um papel preponderante na descolonização, é depois ultrapassado e acaba – claramente já marginalizado – a condenar de modo explícito a forma como decorria a evolução dos acontecimentos em Angola e a posição da parte portuguesa….(JAS)

   Pelos vistos estava errado ao considerar que o Partido Socialista e Mário Soares dominaram o processo da descolonização. (AB)

…Recorde-se que, é em torno de África, a propósito do ultimato inglês, que a propaganda republicana mobiliza a opinião pública contra a Monarquia e o Partido Republicano ganha expressão nacional….(JAS)

   Uma ironia, perante a invocada herança republicana dos atuais socialistas; o conceito de integridade do território mudou. E o povo, preocupado em sobreviver, aceita o que lhe “dão”. (AB)

…Costa Gomes foi secretário de Estado de Salazar – posto de que foi demitido pelo seu envolvimento na conspiração abortada de Botelho Moniz -, foi comandante-chefe das Forças Armadas em Angola; foi Chefe de Estado Maior das Forças Armadas ao tempo de Caetano; foi demitido do cargo pouco antes do 25 de Abril e recuperou-o após o 25 de Abril; foi Presidente da República, sucedendo a Spínola….(JAS)

   É obra!, consta que foi preponderante no desfecho do 25/11/2018. (AB)

….É impossível pensar, por exemplo, que a URSS se tenha disposto a intervir de modo tão claro em Angola sem dispor de garantias antecipadas de que os Estados Unidos não se iriam opor frontalmente a essa intervenção….(JAS)

    Em plena Guerra Fria, aquelas duas potências repartiram o mundo conforme os seus interesses. Estava em causa o acesso direto aos recursos dos territórios administrados por Portugal. Mais que os direitos humanos ou o direito dos povos à autodeterminação. A prova disso é a atual olímpica indiferença da comunidade internacional perante as oligarquias instaladas nesses países e o estado de profunda miséria em que os respetivos povos vivem. (AB)

…Spínola não esconde a sua exasperação progressiva, o seu desespero, a sua impotência, traduzido num discurso cujas conotações fascistas (nomeadamente no Alfeite e em Tancos) são cada vez mais claras. Ao mesmo tempo que assina o reconhecimento do direito à independência dos povos colonizados, Spínola evoca as “sagradas parcelas” do “nosso ultramar” e transfere para a “Mãe-Pátria” as razões de ser da luta desencadeada pelo Exército português contra os povos das colónias: “Responderemos com a guerra aos que nos quiserem fazer a guerra”.

   Spínola, derrotado na Guiné na sequência da perda da supremacia aérea para o PAIGC – graças ao apoio militar da URSS e de Cuba -, perante a intransigência de Marcelo na recusa de entabular negociações com o inimigo, deixou-se perder pela sua vaidade e contradições, aceitando o penacho da presidência acreditando, ingenuamente, que os restantes protagonistas do golpe de estado aceitariam a sua liderança na condução das negociações com os movimentos de libertação. Melo Antunes e Otelo, irresponsavelmente ou premeditadamente, assumiram, perante os negociadores africanos, por parte do Estado português, responsabilidades para as quais não tinham mandato. (AB)
Foto: Peniche, Porto de Pesca
Peniche, 16 de Novembro de 2018
António J. R. Barreto

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

O 25 de Abril Visto da História (notas P10)


 O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais

…Ora São Francisco de Assis fez igualmente a sua opção de classe – pelos pobrezinhos. Só que ele, ao fazê-la, fê-lo abdicando dos seus privilégios – o que não sucede com muitos destes militantes que, não contentes em preservar os seus privilégios de natureza social e económica, pretendem ainda alarga-los a privilégios de natureza ideológica, fazendo-se a si próprios “condutores da classe operária”. (JAS)

   Tudo resumido, já se percebeu que a ânsia de justiça social e económica, não passa em muitos casos - para não dizer todos -, de um veículo de desbravamento dos caminhos do poder; a velha compulsão primordial das sociedades humanas. (AB)

A Descolonização e os jogos do poder:

….Nascido em 1921, o PCP não conseguiria entretanto até 1926 expressão nacional significativa. Ilegalizado pouco tempo depois, o PCP vai, por isso, ser um partido que se estrutura quase inteiramente na clandestinidade. Isto conduz imediatamente a que a “osmose” entre o partido e o corpo da sociedade portuguesa seja escasso….(JAS)

O que ainda hoje, em democracia, se verifica e contrasta com o poder de facto que detém através dos sindicatos da administração pública que lhe permitem manter sequestrada a sociedade civil. Um preço demasiado elevado da liberdade política incondicional. (AB)

...A URSS passa a funcionar para o PC Português como Roma para os católicos. (JSA

   Com a particularidade de a URSS prover generosamente ao seu financiamento – segundo li por aí da ordem dos 10 milhões de dólares por ano. Isto põe em causa o autoproclamado patriotismo do PCP. Ao obedecer às diretivas comunistas para Portugal, o PCP não tinha em conta os interesses nem dos operários nem dos camponeses, antes, servia-se deles pm nome da difusão do imperialismo soviético. (AB)

…Repare-se aliás - a mero título de curiosidade – que a viragem política em Portugal só começaria verdadeiramente uma vez praticamente resolvida, a favor do MPLA, a resolução da questão angolana….(JAS)

   Fui-me apercebendo desta versão, há não muito tempo, há medida que fui diversificando as leituras sobre os acontecimentos político-militares da época. De facto, se o PCP detinha o controlo avassalador da maioria das forças militares, o recuo de Cunhal, na “hora da verdade”, quando confrontado por Costa Gomes, é surpreendente. Ou estaria a contar com diferente desfecho. O certo é que Otelo hesitou, temendo, talvez, as consequências duma guerra civil, deixando sem ordens as forças afetas aos comunistas, entre as quais os fuzileiros - força decisiva na insurreição republicana de 1910 -, tendo sido rapidamente neutralizado por Ramalho Eanes. Sabemos também que a abdicação de Cunhal teve a ver com a promessa de integração do PCP na democracia por Melo Antunes - comunista desde os tempos da Academia Militar, onde foi colega de Alpoim Galvão. E sabemos, segundo o testemunho de Zita Seabra que ter-se-á justificado perante os membros do comité central, com um recuo estratégico que permitiria avanços maiores no futuro “um passo atrás para, mais tarde, dar dois passos à frente”. O primeiro passo à frente foi dado com a sua admissão às eleições constituintes e posterior permanência no sistema democrático. O segundo passo parece em curso induzindo a desagregação dos serviços públicos e agravando os conflitos de classe, nomeadamente entre setor público e setor privado. O que é certo é que, Angola e Moçambique, foram entregues de mão beijada aos movimentos guerrilheiros comunistas, através de um ato eleitoral que não passou de uma encenação. (AB)
Foto: Peniche, Marginal de norte
Peniche, 9 de Novembro de 2018
António J R. Barreto

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

O 25 de Abril Visto da História (notas P9)


 O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais

….Ao tentarem correr com o padre que ao domingo faz o sermão na missa, certos partidos políticos sonham no fundo substituir-se à igreja pondo um seu militante a celebrar a missa de domingo e a proferir o sermão….. As hierarquias dos partidos leninistas reproduzem a hierarquia da igreja. … (JAS)

   Isto tem ar de brincadeira mas é bem sério; o que está em causa não são os valores cristãos, cuidadosamente substituídos pela “ética republicana, mas o poder, o poder exercido pela igreja católica desde a fundação da nacionalidade, em decadência a partir da guerra civil de 1832/1834 na qual os maçons foram preponderantes. A ratoeira da laicidade do Estado - como se o Estado tivesse que ser religiosamente neutro para respeitar todas as religiões em geral - permitiu aos governos de inspiração jacobina ir “desbastando” a influência católica acabando na difusão do islamismo com censuráveis intuitos políticos (um povo para um partido em vez de um partido para o povo). (AB)

A ciência substituiu a religião…..os sistemas ideológicos são anticientíficos na medida em que representam uma cristalização de princípios e conhecimentos em determinado momento histórico….A censura ideológica à ciência por parte da Igreja Católica na Idade Média, foi ressuscitada de facto, por exemplo, na Rússia estalinista….. (JAS)

   Quanto à ciência, ­­apesar dos sucessivos equívocos dos “cientistas”, paradoxalmente, tornou-se, dogmática, promíscua, instrumentalizável, traindo os princípios iluministas, pondo em causa a qualidade dos respetivos regimes políticos. (AB)

…Aliás o protestantismo afirma-se essencialmente como uma associação entre uma ordem divina e uma ordem material surgida com a ascensão da burguesia, conquistando predomínio nos países que mais cedo conheceram um processo de expansão capitalista….(VJS)

   Parece-me haver aqui um equívoco de VJS; é provável que o processo tenha tido origem nas célebres lutas do campesinato alemão contra a Igreja Católica, na fundação, profundamente participativa e aberta, do Protestantismo – introduzindo uma prática democrática e austera na cultura protestante, em 1517, com a discussão das célebres 95 teses de Martinho Lutero na igreja de Wittenberg – e, com o advento do calvinismo, na supressão do conceito de pecado atribuído até então aos juros de capital. Assim, terá sido a evolução do cristianismo através do protestantismo e calvinismo que criou as condições para o advento e desenvolvimento do capitalismo. (AB)

…Mais, o Partido é aquele corpo místico - no sentido em que a igreja o é – perante o qual nos reconhecemos e nos afirmamos como fiés de um culto a um Ser supremo, que dá sentido à nossa existência….Nestas condições, o Partido não é uma emanação de classe, uma expressão orgânica da classe, mas um edifício construído no vazio, sustentado pelos alicerces abstratos da ideologia, e que se reclama da representação (mítica, evidentemente) da classe. (VJS)

   Aqui radica um dos paradoxos das democracias partidárias; o anticlericalismo e o antipatriotismo constantes das doutrinas partidárias em geral - sobretudo por parte dos partidos ditos de esquerda -, tem mais a ver com a ascensão e sustentação do poder destes, ocupando o vazio ideológico, do que com a natureza intrínseca daqueles conceitos. Os partidos substituem-se à Igreja e ao Estado, constituindo uma perversão dos respetivos regimes. Assim, não é de estranhar a atual deriva tendencialmente apátrida e areligiosa na atual União Europeia, o que pode ser visto como um retrocesso social. De facto, assistimos, hoje, ao absurdo de, em países europeus democráticos, membros das estruturas públicas convidarem os seus concidadãos eleitores a saírem do país, em caso de desconforto ou desacordo com as políticas implementadas. (AB)

Foto: pormenor das falésias da Marginal Norte em Peniche

Peniche, 08 de Novembro de 2018
António J. B. Barreto

sábado, 3 de novembro de 2018

O 25 de Abril visto da História (notas P8)


O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais

  
O apelo à população rural, sobretudo das regiões de pequena e média propriedade, é uma constante dos partidos de direita. E a verdade é que esse apelo encontra resposta. Ora isto coloca um problema…que de resto se arrasta há muito tempo sem solução: a questão das relações da cidade com o campo. …. As cidades tornam-se o cenário artificial de um país que continua a ser predominantemente rural. …. E isto coloca de novo o problema da incapacidade dinâmica da burguesia portuguesa - que nunca leva à prática uma reforma agrária, que não faz a mecanização da agricultura e muito menos a sua industrialização. …trata-se de facto, nestes casos, de uma reação natural a um desenvolvimento, que de desenvolvimento tem apenas o discurso, a ideologia. ….eu preferiria, relativamente ao campo, a classificação de “indicador de desenvolvimento”. (JAS)

   É histórico; o conservadorismo da população rural nas regiões de minifúndio deve-se ao enraizamento do sentido de propriedade e também à profunda cultura cristã. Por outro lado, a população rural das regiões de latifúndio é mais acessível à doutrina progressista seja pelo regime de propriedade - marcada pelo assalariado -, seja pela heterogeneidade religiosa da população durante o processo do povoamento.

   Já o desequilíbrio persistente da relação de forças entre “a cidade e o campo” tem origem na significativa perda de relevância económica do setor agrícola, em clara decadência numa economia em transição, mas também devido à constituição e funcionamento das estruturas partidárias, que, claramente, subalterniza as regiões do interior, e constitui, em si mesmo, um dos maiores paradoxos do atual regime político.

   A falta de industrialização agrícola em Portugal terá muitas causas, como a crónica falta de capital - que caracteriza toda a economia nacional, desde sempre, agravada com a expulsão dos Cristãos-Novos -, mas, a que me parece decisiva e consiste na inviabilização económica da propriedade rural na sequência do fim dos morgadios e na alteração do regime de propriedade, que ocorreu no século XIX.

…Em contrapartida, entre o funcionalismo público, e contrariamente às expectativas, foi a linha PCP que saiu vencedora das primeiras eleições realizadas com vista à formação do sindicato daquele setor….(VJS)

   E tem sido assim até aos dias de hoje, para desgraça de Portugal; à “boa” tradição comunista, o PCP, através do controlo que exerce sobre os sindicatos da função pública via Intersindical, detém um poder de influência na governação muito superior à sua representatividade eleitoral. Além da evidente distorção democrática, o PCP, usando das prerrogativas que a lei lhe confere, condiciona setores vitais da administração pública alimentando conflitos sociais e degradando a competitividade económica geral sem contemplações, em nome dos interesses do “novo proletariado”, os “idiotas úteis” da modernidade.

 
…Ora, com reveladora frequência, verificamos que quanto mais acentuada é a má consciência pequeno-burguesa desses dirigentes mais eles ostentam uma “autossuficiência” de carácter já patológico, um exclusivismo, um sectarismo perfeitamente doentios, uma obsessão patética de serem os “pais ideológicos” da classe operária….. Antagónica à concepção leninista era, afinal, a concepção marxista, segundo a qual a emancipação dos trabalhadores é obra dos próprios trabalhadores. (VJS)

   Apercebi-me disso mesmo ao constatar a origem pequeno-burguesa da generalidade dos protagonistas das esquerdas em Portugal, desde o 25 de Abril. O caso mais flagrante da atualidade é o dos ativistas do Bloco de Esquerda, mas não só. Operários e camponeses, em geral o povo simples, não tem disponibilidade para o “lero-lero” político. Mas não se trata apenas de eventual “má-consciência de classe”, será mais uma necessidade compulsiva de protagonismo e de aproximação ao poder, ou mesmo do seu exercício. Daí a “perigosidade” dos “intelectuais” na evolução das sociedades; a outra face da moeda.(AB)

Foto: Peniche, Marginal Norte
Peniche 3 de Novembro de 2018
António J. R. Barreto