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domingo, 28 de agosto de 2016

Expropriem-nos!

  

 
   Fernando Botero, The Presidential Family, 1967
 
   Desde tempos imemoriais que o Homem, na sequência ou eminência de catástrofes, recorre ao sacrifício de animais ou pessoas, incluindo familiares próximos, para apaziguamento dos deuses, numa demonstração de obediência e subserviência incondicional. O Velho Testamento está repleto destes casos, o mais conhecido o de Abraão, que estava disposto a matar o próprio filho, afetuoso, obediente e inocente, para demonstrar o seu amor a Deus.  Com o seu exemplo, Cristo deu um contributo decisivo pondo termo a esta prática bárbara, restituindo ao Homem a capacidade de superação das suas dores, culpas, bastando para tanto, o seu arrependimento sincero, libertando-o da prepotência das hierarquias eclesiásticas e seus próceres. Porém tal fenómeno, apesar disso, repete-se ao longo dos tempos em que o poder suscita, frequentemente, na maioria das pessoas, uma obediência incondicional na esperança de obtenção da comunidade,  aceitação, tolerância ou clemência.
 
   Também os ancestrais "direitos naturais" de vingança, de sangue ou de honra, características da Antiguidade ou da Idade Média, não estão totalmente erradicadas nas sociedades modernas, com especial ênfase nas comunidades mafiosas sicilianas, americanas, ciganas e outras. Pelo contrário, em especial a segunda Guerra Mundial, consagrou o sacrifício de civis como legítimo alvo das forças militares em confronto.
 
   No caso dos incêndios que devastam as florestas nacionais não é difícil descortinar o mesmo espírito de vingança na sociedade portuguesa, tanto mais que a evolução político-económica dos últimos anos, aprofundou e fez alastrar como nunca, velhos ódios, entre a população.
 
   "São os madeireiros que metem fogo às florestas para reduzirem os preços da matéria-prima, são os mentecaptos cuja deficiência compele a experiências pirómanas, são os bombeiros que adoram o ofício a ponto de meterem fogo à floresta, são os interesses empresariais associados aos incêndios, fonte inestimável de rendimentos. Ultimamente, dei comigo a pensar que certos interesses político-partidários não devem ficar fora do cesto da suspeição; afinal, perante a extensão da floresta ardida este verão, as esquerdas, clamam pela coletivização das terras, ainda que encapotadamente, como castigo para os prevaricadores dos proprietários, esses criminosos "usurpadores do património coletivo" que tanto desvelo suscitam dos igualitaristas.
 
     Ora, os incêndios florestais são naturais e necessários à regeneração e enriquecimento da floresta. O húmus resultante dos detritos florestais propiciam a sustentabilidade e diversidade animal. Ao Estado compete encontrar forma de controlar este processo de forma a proteger as populações minimizando os estragos.
 
   As causas dos incêndios são múltiplas e bem conhecidas:
 
      - A transmissão indivisível da propriedade rural foi, no século XIV, cancelada passando a lei a impor a sua repartição pelos legítimos herdeiros. Este processo culminou na inviabilização económica da propriedade rural, razão primeira do seu abandono.
 
      - A emergência do setor terciário, a economia dos serviços, em detrimento dos setores primário e secundário que se verificou sobretudo no mundo Ocidental no século XX, acelerou o abandono dos campos, em marcha desde e era pré-industrial, séculos XVII e XVIII, e o consequente abandono do mundo rural..
 
      - A expansão do ensino superior, como "elevador social" associado ao estigma do trabalhador rural, incentivou as novas gerações à qualificação para serviços, designadamente públicos.
 
      - O caso português contempla ainda os complexos "progressistas" que desataram a desmantelar todos os símbolos do Antigo Regime, entre os quais o programa de gestão das florestas públicas. Uma rede nacional de guardas florestais assegurava a gestão das matas nacionais, cortando matos, desbastando árvores e vigiando a sua utilização, razão suficiente para dissuadir os habituais desleixos. A nível superior, altos quadros da especialidade, tratavam de estudar e planear a reflorestação contemplando a diversidade florestal, o retardamento dos fogos e a implementação de acessos às ajudas. Tudo foi cancelado por Álvaro Barreto, quando Ministro da Agricultura, que, alegadamente, cedendo aos interesses das empresas de celulose - por causa das quais, as autoridades destruíram a Praia da Claridade -, implementou a desastrosa monocultura do eucalipto.
 
   A adesão de Portugal à CEE/UE, teve como consequência económica o decrescimento dos setores primários, devido à baixa produtividade e falta de competitividade face aos seus parceiros europeus. Os abundantes financiamentos para o abandono das culturas não foram compensados com medidas de prevenção dos riscos inerentes, nomeadamente em matéria de segurança.
 
   Por último, segundo consta, anda por aí uma nova entidade de gestão florestal a aplicar pesadas multas a torto e a direito aos desgraçados dos proprietários que têm a veleidade de querer tratar das suas propriedades, cortando matos ou efetuando desbastes.
 
   Ao Estado compete zelar pelos bens das pessoas, incluindo as propriedades florestais, nomeadamente, impedindo os incendiários de destruir a propriedade alheia. Ao invés, o Estado, que desleixa a gestão da sua própria floresta, não protege os bens dos cidadãos, como é de sua obrigação e esbanja os dinheiros públicos sem dar as explicações a que está obrigado por lei, sempre insaciável por mais recursos, afia o dente para estraçalhar os cidadãos, proprietários por inerência, já fustigados com IVAS, combustíveis, eletricidade, águas, licenças, taxas, e tudo o mais que os há-de revoltar e fazer denunciar as ditaduras disfarçadas de democracias do "absolutismo progressista"!
 
   Ouvi há dias um "especialista" na TV invectivar, aludindo à lei, um proprietário que disparou uns tiros de caçadeira sobre um helicóptero que tentava abastecer-se na sua piscina, ou depósito. Não terá ele direito a salvaguardar a sua água para proteger a sua propriedade? O mesmo iluminado" apontava, em tom de crítica, a dispersão habitacional como causadora da dificuldade do combate aos fogos florestais! Ora, com a insanidade que o atual governo demonstrou nas alterações aos impostos sobre a propriedade habitacional, é natural e compreensível que as pessoas abandonem as cidades e o litoral para se instalarem nas zonas rurais. Afinal, talvez seja esta a medida que faltava para reverter a desertificação do interior!
 
À semelhança do que acontece com o abandono dos centros urbanos - o Estado estraga tudo em que mete a mão - a reversão do abandono das matas - e dos centros urbanos - consiste, tão simplesmente, em tornar a viticultura viável e não em servir de pretexto para mais impostos dos indefesos cidadãos.
 
Os decisores políticos nunca são responsáveis, porquê? Simples; porque dominam as instâncias normativas e jurisdicionais!, Então, onde está a vantagem da democracia?, em escolher o ditador? 

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