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domingo, 19 de janeiro de 2020

O exílio dos “heroicos antifascistas”

  
    Pensávamos nós, o povo ingénuo e laborioso, em 74, que os excluídos políticos da “longa noite fascista” tinham suportado as agruras do exílio numa espécie de imolação patriótica, enfrentando a pobreza e o opróbrio político e social, sem desfalecimento, pelas causas da democracia e da autodeterminação dos povos das províncias ultramarinas. Engano, nalguns casos a realidade foi bem diversa. Acreditados junto de Ben Bella pela mão de Humberto Delgado, convocado a líder da “Frente”, os “heroicos antifascistas” beneficiaram dos apoios logísticos e financeiros do novel Presidente. Instalados em moradias abandonadas pelos colonos franceses, cedidas pela Presidência argelina, não lhes faltaram cargos bem remunerados no aparelho estatal, nem sequer meios para operacionalizar a “Rádio Portugal Livre”. Valendo-se da prerrogativa presidencial de validação prévia das entradas e saídas na Argélia dos seus concidadãos, os “heroicos antifascistas” logo trataram de taxar drasticamente os parcos rendimentos dos exilados residentes - cerca de 40 - para financiar o “altruísmo” da Frente e o salário do seu Secretário-Geral, Piteira Santos. Foi esta uma das causas da rotura de Humberto Delgado com a FPLN - Frente Patriótica de Libertação Nacional - o qual se recusou a pactuar com tal prepotência, denunciando-a frontalmente, como era seu timbre. A outra causa da rotura prende-se com divergências de estratégia; enquanto Delgado queria passar, de imediato, à ação armada - tal como a FAP, Frente de Ação Popular, de Francisco Martins Rodrigues, João Pulido Valente e Rui D’Espiney, dissidentes do PCP -, Cunhal e o seu PCP, faziam jogo duplo; comprometendo-se com esta estratégia na 2ª conferência da FPLN, ato contínuo, trataram de protelar a preparação inerente, congeminando a 3ª conferência em moldes tais - cerca de dois terços dos participantes eram membros do PCP - que provocaram o a rotura de Delgado com a FPLN e o abandono da mesma pelo democrata Emídio Guerreiro. 

   Foi o princípio do fim de Humberto Delgado, o qual, a partir desse momento, só morto, serviria a causa da oposição. 
   Vejamos o que diz Patrícia Mcgowan, no seu livro “O Bando de Argel” (pág. 29/30):
“O que aconteceu na Argélia, e levou à morte do General Delgado, situa-se no mesmo quadro. A Frente Patriótica de Libertação Nacional, foi o título pomposo de um grupo de conspiradores, cujo fim era o aproveitamento político de ações e sacrifícios feitos por outros. Os Piteiras, Alegres, Titos de Morais e companhia, não comeram em África do Norte o pão amargo do genuíno exilado político. Gozaram dum exílio dourado, à custa dum povo árabe que ainda chorava um milhão de mortos, reclamando-se falsamente duma representatividade que não tinham; à espera, como abutres, que, em África, o sangue de pretos e brancos preparasse a queda do regime que eles próprios eram incapazes de derrubar.”




Ben Bella (Presidente argelino em 1964)

Peniche, 19 de Janeiro de 2020
António Barreto

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