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quinta-feira, 28 de junho de 2018

Da História de Portugal, notas VIII


Da Lusitânia a Portugal
De Diogo Freitas do Amaral
Bertrand Editora
Notas VIII (sobre a obra)
A Grande Crise Nacional de 1383 e 1384 



   A crise da sucessão foi resolvida nas Cortes de Coimbra realizadas de Março e Abril de 1385, graças à argumentação do Dr. João das Regras, Chanceler do Regente D. João.

   Antes de mais, sublinhe-se a “faceta democrática” das Cortes, uma vez que, desde D. Afonso III, que estas integravam “os três Estados”: Clero, Nobreza e Povo, ao que parece, uma novidade para a época. Ora vejamos como era composta: 11 bispos, 70 fidalgos e 70 homens bons (representantes dos municípios por eleição)! O Povo representado ao nível da Nobreza, à época, é motivo de enaltecimento para a Monarquia Lusa. Não sei se estou certo, mas julgo que a participação do povo em Cortes ou Assembleias Legislativas só veio a ocorrer, no Reino Unido, após a Revolução Gloriosa de 1689, e em França, após a Revolução Francesa de 1789.

   João das Regras considerou o trono vago, após esvaziar, com eloquência, a legitimidade de três dos candidatos; D. João I de Castela, por ter violado o Acordo de Salvaterra de Magos invadindo Portugal, e dos Infantes D. Pedro e D. Dinis, por não ter sido reconhecido pelo Vaticano o casamento de seus pais, D. Pedro I e D. Inês de Castro, e por terem levantado armas contra Portugal ao serviço dos reis de Castela, respetivamente, Henrique II e D. João I.

   Quanto a D. João I de Castela, duas outras causas da sua deslegitimação à sucessão, consistiriam; uma, na condição de herege com que fora punido por Urbano IV, por ter reconhecido o antipapa Clemente VII, outra, pela sua linha dinástica ao trono luso ser do lado materno - a sua mãe era irmã da mãe de D. Fernando.

   Já do lado de D Beatriz a deslegitimação assentava na dúvida quanto à paternidade de D. Fernando e na irregularidade canónica do seu casamento, uma vez que, o seu marido, D. João I de Castela, era também seu parente - primos em 2º grau; a mãe de D. João I de Castela era tia-avó de D. Beatriz.

   O vínculo dinástico do Mestre de Avis era tão ténue - a mãe do futuro D. João I seria, eventualmente, plebeia - que João das Regras nem o invocou, limitando-se a referi-lo. Porém, conhecedor da doutrina do famoso escolástico São Tomás de Aquino, que professara cerca de um século antes em Bolonha e Paris, usou-a para sustentar a legitimidade das Cortes para eleger o Rei.

   São Tomás de Aquino, Albertus Magnus, e outros, desenvolveram a epistemologia - análise da natureza, origem e consequências do pensamento - sucedendo ao platonismo - orientação do comportamento pela Fé -, dedicando-se à formulação da filosofia cristã. Em consequência, operou-se uma transformação vital, no Ocidente, na interpretação da origem divina do poder; assim, enquanto segundo o Apóstolo São Paulo, fundador do Catolicismo, omnis potestas a Deo (todo o poder vem de Deus), segundo Aquino, omnis potestas a Deo per populum (todo o poder vem de Deus através do Povo) e, ad populum pertinet electio principi  (ao povo pertence eleger os príncipes).

   Foi com à luz desta filosofia que João das Regras sustentou a legitimidade das Cortes para eleger um Rei, definindo desde logo o perfil adequado ao novo Rei de Portugal, indicando o Mestre de Avis como detentor de tais características.

   Refere o autor que, nos séculos XV e XVI, a monarquia portuguesa terá sido a mais democrática do mundo conhecido, à época, porque o Povo participava nas Cortes - em paridade com a nobreza -, e estas elegiam ou aclamavam os reis. Notável e enaltecedor, sem dúvida.
 
 
Dr João das Regras

Peniche, 26 de Junho de 2018
António J. R. Barreto

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