O 25 de Abril Visto
da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José
António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em
vésperas as primeiras eleições presidenciais
Foram, pois, os excessos cometidos pelo PCP no período que ficou
conhecido por PREC - com a ocupação do aparelho estatal, o domínio dos
quarteis, os saneamentos nas empresas, as violações da propriedade privada, as
ocupações dos principais jornais - com a “curiosa” participação de José
Saramago -, as prisões arbitrárias dos seus aliados do COPCON, a agitação
social marginal da sua excrescência sindical, a Intersindical, etc. - que
suscitaram o afrontamento do marginalizado PS que lhe viria a granjear
confortável maioria nas eleições para a Assembleia Constituinte, seu principal
capital político até aos dias de hoje. A ironia atual reside cedência do PS ao
PCP pela imperiosa necessidade daquele ascender à governação.
…Torna-se claro que muitos dos
atuais dirigentes socialistas são
“velhos republicanos”. Entre o PS de hoje e o Partido Republicano de então existem,
de resto, aproximações que, podendo não passar de coincidências, não deixam de
ser curiosas. …(JAS)
É certo que até Mário Soares invocou a herança de Afonso Costa sendo
recorrente, entre socialistas, as referências à famigerada e duvidosa “ética
republicana”. Por outro lado, as ligações à maçonaria de notáveis do atual PS -
Vasco da Gama Fernandes, João Soares, António Arnault, José Magalhães, entre
outros - também ajudam a consolidar esta tese. (AB)
…durante a I República o
desajustamento entre o Estado e a estrutura da sociedade portuguesa terá sido o
maior que alguma vez se verificou em Portugal. Veja-se, apenas, o
anticlericalismo radical dos políticos republicanos - um fenómeno tão
artificial quanto é certo….que o país continuava a ser, na sua grande maioria,
um país católico….Por outras palavras, em que medida é que o “espírito do 25 de
Abril” correspondeu a um ajustamento do Estado à sociedade Portuguesa. …..se,
entre 1910 e 1926 a sobreposição entre a República e o Estado foi uma situação
artificial, então é perfeitamente natural que certas lutas que foram da
República mantenham ainda hoje uma certa atualidade. (JAS)
Não há dúvida que o anticlericalismo está bem patente no atual PS, bem
como nos restantes partidos de esquerda, não tão radical como então, mas sistemático
e persistente. Donde - até pela predominância da doutrina de esquerda no
articulado da Constituição - a consagração do Estado Laico, aceitando-se pela
defesa do princípio da não discriminação religiosa, não deixa de ser uma afronta
à cultura popular dominante, hoje, paradoxalmente, em risco de sujeição à
intolerância do islamismo.
…Os mais destacados dirigentes do
Partido Socialista português são normalmente oriundos das classes médias e
exercem, por outro lado, atividades sem ligação direta, a maior parte das
vezes, ao setor produtivo….(VJS)
Esta característica não é exclusiva do Partido Socialista; ela está
presente em quase todos os partidos, grandes ou pequenos. A pequena e média
burguesia ou a administração pública são as fontes donde tem brotado o caudal
humano político em Portugal. Só o Partido Comunista, nos primórdios, integrava
quadros oriundos do operariado ou do campesinato. Quanto a mim, há uma
explicação para isto; o povo, operários e camponeses, antes de mais, têm que
garantir a sua sobrevivência, o que lhes ocupa todo o tempo disponível. Há
poucas décadas atrás muito pouca gente tinha salário; o ganha-pão tinha que ser
“arrancado” à terra e ao mar em cada dia por todos os membros da família, desde
tenra idade. (AB)
(foto: Peniche, na Praia do Quebrado)
Peniche, 27 de Outubro de 2018
António J.R.Barreto
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