O 11 de Março
(Síntese de António Barreto)
Frustrada a criação do Conselho da Revolução, a velha e bem oleada máquina do PC trata, de imediato, de alertar a opinião pública para as manifestações da reação que, garantiu, estariam prestes a ocorrer; uma inventona destinada a criar as condições para o afastamento dos oficiais não marxistas do MFA que os impediam de prosseguir com a sua agenda totalitária.
Uma nova ameaça atemorizou o PC e os partidos autorizados, PS, PPD e
CDS; o Partido da Democracia Cristã, fundado pelo major, membro do MFA e do II
Governo Provisório, Sanches Osório, emergiu, polarizando as esperanças da
população desiludida. Receosos e ardilosos, Cunhal e os seus correligionários
logo desencadearam uma campanha de desacreditação e violência contra o novo
partido, incluindo-o no rol dos seus alvos da intentona que preparava.
Numa operação preparada pelo KGB para o PC, o traidor Vasco Gonçalves
entrega a Palma Inácio, da Luar, e a Otelo, do Copcon, duas listas com nomes de
civis e militares a abater; Inácio assassinaria os que estavam detidos, Otelo,
assassinaria os outros.
Cópias daqueles documentos chegaram às mãos do General Spínola e de
membros do MFA. A data da matança, que ficou conhecida como “Matança da Páscoa”
seria anunciada através da passagem de uma peça de teatro na TV. A exibição na
TV, dessa canalha ao serviço do comunismo, de uma peça de teatro com características
semelhantes provocou a debandada dos oficiais spinolistas procurando salvar as
próprias vidas.
A 11 de Setembro dá-se a farsa do bombardeamento do RAL1, vazio. O “povo
vigilante” ao serviço do PC aguardava nas proximidades o desenrolar da ópera bufa,
e a canalha da TV, igualmente avisada, registava a ocorrência da mesma. Um
soldado, não avisado, é atingido e morre. Logo foi transformado no novo mártir,
qual Catarina Eufémia. Porém, o assassinato a sangue frio, pelas costas, a
rajada de metralhadora, por gente do RAL 1, de um casal sumariamente julgado
por motivo fútil, nem sequer foi noticiado no país.
Com a TV a entreter o povo com a reportagem das investidas da
“contrarrevolução”, o PC não perdeu tempo. Chegara a hora de fazer a última
purga do MFA e de constituir o ansiado Conselho Superior da Revolução. Convocada
à pressa, a Assembleia Geral do Movimento das Forças Armadas, já depurada dos
oficiais anticomunistas, arregimenta faxinas, sentinelas e até civis, para
conseguir o quorom estipulado de 200
elementos. O famigerado e tristemente célebre Conselho da Revolução foi,
finalmente, constituído como poder supremo do país. O grande propósito
comunista estava alcançado. Da histórica Assembleia não foi elaborada ata, dada
a irregularidade dos participantes. De imediato foram nacionalizadas a banca e
numerosas empresas. Foi a consagração de décadas de luta do PC ao serviço do
imperialismo soviético.
PS, PPD e CDS, atemorizados e indignos, renunciam aos seus princípios,
colaborando na encenação pública comunista. Sucedem-se as manifestações das
brigadas vermelhas - tal como hoje, aliás -, pagas a xis por cabeça, fazendo-se
passar pelo povo anónimo e atónito. Na frente externa, cantam-se loas à
“Revolução dos Cravos”. No Mundo Ocidental cada país restringe-se à defesa dos
seus próprios interesses, esquecendo os princípios do Mundo Livre, que diz
defender.
À época, o Conselho da Europa votou a favor da entrada de Portugal na
sua organização, apesar das divergências insanáveis do respetivo regime com os
estatutos da mesma. Sinteticamente, Portugal encontrava-se numa estado político
pré-comunista e não pré-democrática, como muitos quiseram fazer crer. Senão,
vejamos:
As eleições para a Constituinte, realizadas
em 25 de Abril de 1975, foram condicionadas pelo MFA, que afastou vários
partidos do processo e impôs aos restantes uma Convenção Constitucional onde
ficou definida a estrutura do novo regime, elaborada, nas suas linhas mestras,
pelo PC. A Assembleia limitou-se a ratificar o que foi imposto aos partidos
pelo MFA e estes, anuíram ao papel de idiotas úteis, emprestando uma aparência
de pluralismo à Assembleia. O processo democrático ficou, assim, ferido de
morte; pela falta de pluralismo partidário, por se ter enganado aos cidadãos e
pela total ausência de liberdade na elaboração da lei fundamental.
Neste contexto, o modelo que vigorou é característico das democracias
populares e não aos regimes das democracias ocidentais, como se pretendeu fazer
crer. Assim, por ordem decrescente de importância, os órgãos de soberania
foram: O Presidente da República, o Conselho da Revolução, a Assembleia do
Movimento das Forças Armadas, a Assembleia Legislativa, o Governo e os
Tribunais.
O Presidente da República era
eleito por um Colégio Eleitoral composto por 490 membros, dos quais 240
pertenciam ao MFA e correspondiam ao Conselho da Revolução e à Assembleia do
MFA. Daqui resultava que o PR seria sempre um militar da confiança do MFA, ao
qual cabia escolher o Primeiro-ministro. (que bela democracia)
O Conselho da Revolução concentrava todos os poderes, grosso modo,
supervisionando e limitando a ação dos restantes órgãos e detendo ainda poderes
especiais; definia a sua própria constituição, fixava o programa político
interno e externo, decidia da constitucionalidade material e orgânica das leis,
validava e sancionava todas as leis emanadas da Assembleia do MFA e do Governo,
substituía a Assembleia e o Governo em matéria militar, sempre que se
justificasse, zelava pelo cumprimento das leis ordinárias e pelos atos do
Governo ou da Administração, conferia poderes constituintes à Assembleia
Legislativa e recomendava correções ou alterações à Constituição, deliberava
quanto ao Estado de Sítio ou Estado de Emergência, colaborava na escolha do
Primeiro-ministro e dos três ministros nomeados pelo MFA, decretava a
dissolução da Assembleia Legislativa, nomeava o substituto do PR em caso de
impedimento do PR em exercício.
Além disto, a Convenção imposta aos partidos determinava que a
Constituição devia consagrar os princípios do MFA e salvaguardar as conquistas
obtidas pelo processo revolucionário, bem como as futuras disposições que
viesse a adotar.
No dia-a-dia praticam-se atentados sistemáticos à vida, aos bens e às
liberdades fundamentais dos cidadãos, numa frontal violação do Estatuto do
Conselho da Europa, da Convenção para a Salvaguarda dos Direitos do Homem e das
Liberdades Fundamentais, bem como os princípios gerais que regem as sociedades
Ocidentais. O Estado de Direito prometido pelo MFA aos portugueses, não foi
cumprido. Em seu lugar, permitiram-se leis revolucionárias, tribunais
revolucionários, brigadas revolucionárias que agridem e matam impunemente.
Apesar da oposição de todos os partidos, à exceção do PCP e do MDP/CDE,
foi consagrado, arbitrariamente, o princípio da unidade sindical, sem consulta
aos trabalhadores, violando o direito de liberdade de associação sindical
conforme disposto na Carta Social Europeia (Turim, 18 de Outubro de 1961).
Igualmente violado foi o direito de Associação política, como se
verificou com a dissolução da Associação dos Operários e a proibição da
Democracia Cristã de concorrer a eleições, com base em acusações não provadas,
tal como ocorreu em 74 com o Partido do Progresso e o Partido Liberal.
O mesmo sucedeu com a liberdade de informação; excetuando a “República”
- órgão do PS - todos os restantes meios de comunicação estiveram sujeitos à
censura dos comités de redação do PC. Antes da nacionalização da banca, MFA e
governo provisório ocuparam as instalações dos hebdomadários independentes -
“Tribuna Popular”, “Bandarra”, “Tempo Novo” e
“Liberdade” -, exceto as do
Expresso, encarcerando vários jornalistas, em clara violação da Convenção para
a Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais.
A rádio e a televisão não tiveram melhor sorte; com o pretexto de terem
colaborado no 11 de Março, Emissora Nacional, Rádio Renascença e RTP, que
praticavam algum pluralismo, foram também submetidos ao jugo do PC através do
MFA e Governo Provisório.
Sobrepovoaram-se as prisões; os detidos - cerca de cinco mil - sem nota
de culpa, sem interrogatório, sem apoio judicial, amontoam-se no Forte de
Caxias, na prisão da Trafaria, na Fortaleza de Peniche, na Penitenciária de
Lisboa, no Aljube, nas prisões civis e militares do Porto, no campo de
concentração de Alcoentre, na prisão de Tires, na Fortaleza de Elvas, etc. Foram
cerca de cinco mil detidos - sem quaisquer ligações ao antigo regime. O
propósito foi o de desencorajar, pelo medo, os cidadãos, de quaisquer veleidades
de discordância com o novo regime.
Logo a seguir ao 25 de Abril, a KGB monta uma polícia política em
Portugal, constituída pelo CPCON, pela LUAR e pela Comissão de Extinção da PIDE
DGS. Fernando Oneto, membro da Comissão de Extinção da PIDE-DGS e do Partido
Socialista, testemunhou estes factos. (morreu, anos depois, num comboio para
Espanha, de súbito colapso cardíaco, tendo havido quem suspeitasse de
assassinato, devido às circunstâncias em que ocorreu).
Foi este o resultado de um ano de ditadura imposta por um bando de
militares que prometeu ao Povo e ao mundo uma democracia pluralista em
Portugal. As vítimas destas arbitrariedades, prisioneiros ou refugiados, são
testemunhos eloquentes do caos instalado, que não se deveu só a Moscovo, mas
também ao criminoso imobilismo das democracias ocidentais.
Ao sancionar os crimes praticados no após 25 de Abril com a decisão de
aceitar a inclusão de Portugal, controlado pela União Soviética, na sua
organização, o Conselho da Europa, descredibilizou-se.
(O acerto de contas ocorreria em 25 de Novembro de 1975. Por tudo isto
custa compreender a recusa, em Portugal, da comemoração do 25 de Novembro. Tal
permite-nos concluir que, os agentes desta recusa, os partidos de esquerda PS,
PCP e BE, rejeitam o regime democrático instituído em Portugal na sequência do
25 de Novembro de 1975. Se tal atitude, por parte do PCP e do BE, é
compreensível - uma vez que representam as forças derrotadas no evento militar
subjacente - já não se compreende no caso do PS, partido que desde a primeira
hora esteve do lado das forças democráticas. Porém, este caso, pode ser
interpretado pelo interesse estratégico deste partido em manter-se vinculado a
um período em que os excessos do PC e a intolerância do MFA aos partidos não
socialistas, constituíram os motores da sua ascensão política.)
Quadro: Batalha de São Mamede
Peniche, 1o de Maio de 2019
António Barreto
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