O 25 de Abril Visto
da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José
António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em
vésperas as primeiras eleições presidenciais
(notas)
Duas das mais prestigiadas
figuras do jornalismo nacional contemporâneo, observadores privilegiados do
processo dito revolucionário do 25 de Abril de 1974, analistas sagazes de
considerável cultura histórica, em vésperas das primeiras eleições presidenciais,
revisitam a História à luz dos acontecimentos políticos da época.
Refere-se, por exemplo, a tradicional
fragilidade orgânica da sociedade civil como causa do protagonismo militar nas
mudanças de regime em Portugal, como o que acabara de ocorrer; o vazio de poder
que se verificou na sequência da destituição do antigo regime, período
designado por PREC; a incipiência das estruturas dos novos partidos políticos,
PS, PPD e CDS contrastando com a do PCP, robustecida por décadas de luta
clandestina antissalazarista - desde 1926; da falta de aderência de todos à
realidade social do país, ao qual impuseram modelos externos a que se
vincularam; da preponderância do tacticismo político em prejuízo da coerência
ideológica; da submissão de todos ao tradicional poder das armas; das
vicissitudes e equívocos de alguns dos principais protagonistas do momento
histórico; da correlação entre os destinos políticos das ex-colónias e de Portugal
europeu, etc..
Uma das curiosidades interessantes reside na referência ao desacordo de
Ramalho Eanes na decisão de reabilitação do PCP, na sequência do 25 de Novembro
de 1975, cujo defensor ativo teria sido Melo Antunes. Outra, na constatação de
que a formação do atual BE parece ter origem nas que apoiaram a candidatura de
Otelo às presidenciais de 1976, como a UDP a FSP e o MES (sendo que grande
parte dos membros deste grupo constituem, hoje, a ala esquerda do PS).
“…Sartre, escreveu algures, escandalosamente, que “nunca fomos tão
livres como durante a ocupação alemã”. Talvez se pudesse acrescentar que a
esquerda portuguesa nunca foi tão livre, ideologicamente, como durante os
cinquenta anos de salazarismo….(VJS)
….O salazarismo emerge como
alternativa histórica a esta dupla incapacidade - da burguesia republicana,
primeiro, do Exército, depois -…. (VJS)
…O apelo a Deus - o apelo à
ideologia - é sempre, evidentemente, um sintoma de incapacidade para resolver
um problema. O reconhecimento de uma impotência para ultrapassar uma
crise….(JAS)
…Temos assim que países como a
URSS, a China ou Moçambique são hoje casos típicos de sociedades ideológicas;
aí, onde os programas de desenvolvimento são fabricados em gabinete e impostos
de cima para baixo, é condição prévia a existência de um Estado forte – que justifica o seu papel fortemente repressivo em
função de uma “cartilha sagrada” existindo acima da própria sociedade e fora de
qualquer discussão, e de um partido único que a pratica e impõe ao conjunto do
corpo social… Trata-se de reduzir as
tensões sociais (leia-se: a dinâmica social), ao zero absoluto – para construir depois sobre o vazio, o Estado
absoluto, omnisciente e omnipresente. Aí, tudo se torna oficial. …(JAS)
…A sociedade burguesa é uma
sociedade que destrói o espírito religioso porque assenta exclusivamente sobre
condições materiais. …. (JAS)
(Foto: Praia de Peniche de cima)
(Foto: Praia de Peniche de cima)
Peniche,21 de Outubro de 2018
António J.R Barreto
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