O Médio-Oriente:
O Médio-Oriente - do Paquistão ao norte do Iraque, mediterrânio e
Somália - de que fazem parte dois dos maiores produtores mundiais de petróleo -
Irão e Arábia Saudita -, tem uma relevância geoestratégica de que resulta
permanente disputa entre as potências económicas mundiais.
O incontestado domínio histórico anglo-americano - britânicos no Irão e
Iraque e americanos na Arábia Saudita - deu lugar a um complexo jogo político
de bastidores, envolvendo, paralelamente, negócios de armamento entre países
Ocidentais e a URSS (Rússia) por um lado e as potências regionais por outro.
Numa Europa anémica, incapaz de resistir à chantagem das potências
dominantes, onde cada membro fazia os seus negócios esconsos, o Ocidente, em
especial a França, apostava no Iraque apesar do envolvimento deste no financiamento
do terrorismo internacional.
Com uma história excecionalmente rica - berço da História -,o Iraque, possuidor
de abundantes recursos minerais, petróleo e água - rios Tigre e Eufrates -, objeto
de sucessivas disputas territoriais seculares, proporcionava ao Ocidente algum
equilíbrio estratégico face à influência que, á época, a URSS tinha na região. Por
outro lado, enquanto governado pela fação sunita, o Iraque funcionaria como
tampão às aspirações expansionistas xiitas a partir do Irão, constituindo uma
ameaça ao Ocidente desestabilizando a NATO a partir da Turquia.
Na sangrenta guerra Irão-Iraque para a qual Saddam Hussein - “homem sólido, duro, com grandes qualidades”,
considerava Alexandre de Marenches - foi
encorajado, por erro de análise do departamento de informação francês,
verificou-se o paradoxal apoio dos israelitas à causa de Teerão consubstanciado
no fornecimento de armas. Quanto ao Ocidente, incluindo Portugal, fornecia
armamento a ambas as partes!
Testemunho do anacronismo e barbaridade do regime dos Ayatollas - o Irão, à época, tinha cerca
de oitenta mil membros do clero, entre Ayatollas
(bispos) e mollás (padres),
disseminados por todo o país, em cidades, aldeias e departamentos -, são as
“crianças sapadoras”. O exército iraniano usava crianças para a desminagem do
terreno! Alexandre de Marenches visitou, no Iraque, um campo
destes jovens prisioneiros; meninos sem pernas e, ou, sem braços, decepados na
tenebrosa missão de fazer explodir minas ocultas. Caminhar sobre os cadáveres
dos meninos constituía garantia de segurança para os militares iranianos!
A Inépcia americana:
A República Islâmica do Irão, hoje uma das maiores causas da
instabilidade regional e internacional, é o resultado da ostensividade e inépcia
da administração Cárter que decidiu derrubar a monarquia autocrática de Mohammad Reza Pahlavi - a dinastia Pahlavi teve início em 1925, na sequência
do golpe de 1921 de que resultou a deposição de Amade Xá Cajar e a subida ao trono de Reza Xá Pahlavi por sua vez deposto e exilado pelos aliados (que
detinham o controlo total da exploração petrolífera no Irão), por se recusar a
expulsar os alemães que, no passado, tinham dado precioso contributo à
modernização daquele país - e substitui-la por uma democracia do tipo ocidental
de cariz socialista (Jimmy Carter era
um democrata).
A administração Cárter revelou
um total desconhecimento do caráter tenebroso do integrismo muçulmano xiita
liderado pelo radical ayatola, Ruhollah Musavi Khomeini, exilado - no
Iraque de 1963 a 1978 e em Paris, de 1978 a 1979 - pelo Xá Pahlavi, que decidiu poupar-lhe a vida.
Beneficiando da complacência
iraquiana e francesa, o ayatola desenvolveu
intensa propaganda revolucionária a partir de Berlim Oriental, onde estava
instalado o quartel-general do partido comunista clandestino iraniano -
“Toudeh” -, que gravava os seus discursos apelando à revolta popular e à
deserção dos militares, e que, depois de copiados, eram distribuídos
profusamente pela população iraniana.
Para ilustrar a causa da
proliferação da subversão revolucionária no Irão, Alexandre de Marenches estabelece
uma curiosa comparação entre a ditadura e a autocracia; enquanto o ditadura elimina
os dissidentes a autocracia tolera-os. Foi o caso do Xá Reza Pahalavi e foi a causa última do fim do seu reinado. A
educação que o Xá recebera na Europa e o confisco de terras que fizera ao clero
- incluindo as do ayatola Khomeini - e
que distribuíra pelos camponeses - constituíram causas da tolerância daquele e
do ódio implacável deste.
Magro, franzino e tolerante,
contrariamente ao seu pai, um gigante a quem “ninguém ousava mentir”, ao Xá Reza Pahalavi “ninguém ousava dizer a
verdade”. Confrontado com os planos de deposição da administração Cárter revelou-se
incrédulo e confiante no reconhecimento Ocidental da importância estratégica do
seu reinado. Detentor de um poderoso exército, este garantia a estabilidade na
região.
Infelizmente, nem nos EUA, nem
na Europa, se fazia a menor ideia de que, entre a população iraniana, havia
pessoas que viviam como os europeus do século XI! Nem a CIA nem a SAVAK – respetivamente
os serviços secretos americanos e iranianos - se haviam apercebido da convulsão
social em marcha. A ânsia de modernização do Império iraniano levara o monarca
a cometer certas imprudências que se revelaram fatais.
Já com a revolução em marcha em
Teerão, confrontado com a turbulência popular em curso, o monarca afirmou
perentoriamente que jamais, em circunstância alguma, mandaria abrir fogo contra
o seu Povo. Alexandre de Marenches compara Mohammed Reza Palavi, ao Czar
Nicolau II e a Luis XVI, vencidos
pela própria fraqueza pessoal.
Jimmy Cárter, o inefável, enviou um seu emissário - general Hauser - num périplo aos quartéis
iranianos ordenando a não intervenção militar no movimento revolucionário sob
pena de cessação do fornecimento de armamento. Assim foi Khomeini colocado no poder motivando a explosão da revolução xiita.
Acolhido incondicionalmente em
Marrocos pelo rei Hassan II, Mohammed
Reza Palavi, confrontado com os riscos que a sua presença representava para
o monarca anfitrião e respetiva família, refugiou-se nas Bahamas donde passou ao
Egipto onde viria a falecer. Hassan II tinha o sentido da honra, da lealdade e
da solidariedade.
Alexandre de Marenches
António Barreto
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