O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José
António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em
vésperas as primeiras eleições presidenciais
…Ora São Francisco de Assis fez
igualmente a sua opção de classe – pelos pobrezinhos. Só que ele, ao fazê-la,
fê-lo abdicando dos seus privilégios – o que não sucede com muitos destes
militantes que, não contentes em preservar os seus privilégios de natureza
social e económica, pretendem ainda alarga-los a privilégios de natureza
ideológica, fazendo-se a si próprios “condutores da classe operária”. (JAS)
Tudo resumido, já se percebeu que a ânsia de justiça social e
económica, não passa em muitos casos - para não dizer todos -, de um veículo de
desbravamento dos caminhos do poder; a velha compulsão primordial das
sociedades humanas. (AB)
A Descolonização e os jogos do
poder:
….Nascido em 1921, o PCP não
conseguiria entretanto até 1926 expressão nacional significativa. Ilegalizado
pouco tempo depois, o PCP vai, por isso, ser um partido que se estrutura quase
inteiramente na clandestinidade. Isto conduz imediatamente a que a “osmose”
entre o partido e o corpo da sociedade portuguesa seja escasso….(JAS)
O que ainda hoje, em democracia,
se verifica e contrasta com o poder de facto que detém através dos sindicatos
da administração pública que lhe permitem manter sequestrada a sociedade civil.
Um preço demasiado elevado da liberdade política incondicional. (AB)
...A URSS passa a funcionar para
o PC Português como Roma para os católicos. (JSA
Com a particularidade de a URSS prover generosamente ao seu
financiamento – segundo li por aí da ordem dos 10 milhões de dólares por ano.
Isto põe em causa o autoproclamado patriotismo do PCP. Ao obedecer às diretivas
comunistas para Portugal, o PCP não tinha em conta os interesses nem dos
operários nem dos camponeses, antes, servia-se deles pm nome da difusão do
imperialismo soviético. (AB)
…Repare-se aliás - a mero título
de curiosidade – que a viragem política em Portugal só começaria
verdadeiramente uma vez praticamente resolvida, a favor do MPLA, a resolução da
questão angolana….(JAS)
Fui-me apercebendo desta versão, há não muito tempo, há medida que fui
diversificando as leituras sobre os acontecimentos político-militares da época.
De facto, se o PCP detinha o controlo avassalador da maioria das forças
militares, o recuo de Cunhal, na “hora da verdade”, quando confrontado por
Costa Gomes, é surpreendente. Ou estaria a contar com diferente desfecho. O
certo é que Otelo hesitou, temendo, talvez, as consequências duma guerra civil,
deixando sem ordens as forças afetas aos comunistas, entre as quais os
fuzileiros - força decisiva na insurreição republicana de 1910 -, tendo sido
rapidamente neutralizado por Ramalho Eanes. Sabemos também que a abdicação de
Cunhal teve a ver com a promessa de integração do PCP na democracia por Melo
Antunes - comunista desde os tempos da Academia Militar, onde foi colega de
Alpoim Galvão. E sabemos, segundo o testemunho de Zita Seabra que ter-se-á
justificado perante os membros do comité central, com um recuo estratégico que
permitiria avanços maiores no futuro “um passo atrás para, mais tarde, dar dois
passos à frente”. O primeiro passo à frente foi dado com a sua admissão às
eleições constituintes e posterior permanência no sistema democrático. O
segundo passo parece em curso induzindo a desagregação dos serviços públicos e
agravando os conflitos de classe, nomeadamente entre setor público e setor
privado. O que é certo é que, Angola e Moçambique, foram entregues de mão
beijada aos movimentos guerrilheiros comunistas, através de um ato eleitoral
que não passou de uma encenação. (AB)
Foto: Peniche, Marginal de norte
Peniche, 9 de Novembro de 2018
António J R. Barreto
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