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quinta-feira, 8 de novembro de 2018

O 25 de Abril Visto da História (notas P9)


 O 25 de Abril Visto da História
(Livraria Bertrand)
Diálogo entre José António Saraiva e Vicente Jorge Silva em 1976 sobre a atualidade política, em vésperas as primeiras eleições presidenciais

….Ao tentarem correr com o padre que ao domingo faz o sermão na missa, certos partidos políticos sonham no fundo substituir-se à igreja pondo um seu militante a celebrar a missa de domingo e a proferir o sermão….. As hierarquias dos partidos leninistas reproduzem a hierarquia da igreja. … (JAS)

   Isto tem ar de brincadeira mas é bem sério; o que está em causa não são os valores cristãos, cuidadosamente substituídos pela “ética republicana, mas o poder, o poder exercido pela igreja católica desde a fundação da nacionalidade, em decadência a partir da guerra civil de 1832/1834 na qual os maçons foram preponderantes. A ratoeira da laicidade do Estado - como se o Estado tivesse que ser religiosamente neutro para respeitar todas as religiões em geral - permitiu aos governos de inspiração jacobina ir “desbastando” a influência católica acabando na difusão do islamismo com censuráveis intuitos políticos (um povo para um partido em vez de um partido para o povo). (AB)

A ciência substituiu a religião…..os sistemas ideológicos são anticientíficos na medida em que representam uma cristalização de princípios e conhecimentos em determinado momento histórico….A censura ideológica à ciência por parte da Igreja Católica na Idade Média, foi ressuscitada de facto, por exemplo, na Rússia estalinista….. (JAS)

   Quanto à ciência, ­­apesar dos sucessivos equívocos dos “cientistas”, paradoxalmente, tornou-se, dogmática, promíscua, instrumentalizável, traindo os princípios iluministas, pondo em causa a qualidade dos respetivos regimes políticos. (AB)

…Aliás o protestantismo afirma-se essencialmente como uma associação entre uma ordem divina e uma ordem material surgida com a ascensão da burguesia, conquistando predomínio nos países que mais cedo conheceram um processo de expansão capitalista….(VJS)

   Parece-me haver aqui um equívoco de VJS; é provável que o processo tenha tido origem nas célebres lutas do campesinato alemão contra a Igreja Católica, na fundação, profundamente participativa e aberta, do Protestantismo – introduzindo uma prática democrática e austera na cultura protestante, em 1517, com a discussão das célebres 95 teses de Martinho Lutero na igreja de Wittenberg – e, com o advento do calvinismo, na supressão do conceito de pecado atribuído até então aos juros de capital. Assim, terá sido a evolução do cristianismo através do protestantismo e calvinismo que criou as condições para o advento e desenvolvimento do capitalismo. (AB)

…Mais, o Partido é aquele corpo místico - no sentido em que a igreja o é – perante o qual nos reconhecemos e nos afirmamos como fiés de um culto a um Ser supremo, que dá sentido à nossa existência….Nestas condições, o Partido não é uma emanação de classe, uma expressão orgânica da classe, mas um edifício construído no vazio, sustentado pelos alicerces abstratos da ideologia, e que se reclama da representação (mítica, evidentemente) da classe. (VJS)

   Aqui radica um dos paradoxos das democracias partidárias; o anticlericalismo e o antipatriotismo constantes das doutrinas partidárias em geral - sobretudo por parte dos partidos ditos de esquerda -, tem mais a ver com a ascensão e sustentação do poder destes, ocupando o vazio ideológico, do que com a natureza intrínseca daqueles conceitos. Os partidos substituem-se à Igreja e ao Estado, constituindo uma perversão dos respetivos regimes. Assim, não é de estranhar a atual deriva tendencialmente apátrida e areligiosa na atual União Europeia, o que pode ser visto como um retrocesso social. De facto, assistimos, hoje, ao absurdo de, em países europeus democráticos, membros das estruturas públicas convidarem os seus concidadãos eleitores a saírem do país, em caso de desconforto ou desacordo com as políticas implementadas. (AB)

Foto: pormenor das falésias da Marginal Norte em Peniche

Peniche, 08 de Novembro de 2018
António J. B. Barreto

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