William Turner; Eruption Bridgman credit
No início do século XVII, 90 % da
população vive ainda da agricultura e a nobreza mantém os seus privilégios
recusando-se a reconhecer igualdade social aos camponeses e artesãos. A igreja
resistia aos avanços da ciência perseguindo Erasmo,
queimando o humanista Giordano Bruno
por heresia em 1600, enclausurando Campanella
durante 27 anos, e obrigando, em 1633 através da Inquisição, Galileu, a retratar-se dos seus “diálogos sobre os principais sistemas do
mundo.
Apesar do poderio espanhol, já em
declínio na américa e na europa, é na Holanda, antigas “Províncias Unidas”, em
Inglaterra e em França que prossegue a longa marcha rumo ao capitalismo. Com um
comércio pujante, uma agricultura moderna, uma burguesia poderosa, ausência de
nobreza e grande tolerância, foi na Holanda que Descartes se instalou em 1625 e publicou o seu famoso Discours sur La Methode pour Bien Conduire
sa Raison et Chercher da Verité dans les Sciences em 1637 e as suas Meditátion Metaphysique em 1641.
Segundo Karl Marx, a Holanda foi o
símbolo do capitalismo comercial e financeiro da primeira metade do século XVII.
Independente da Espanha desde 1609, principal destino dos judeus expulsos de
Espanha e Portugal, implementando a normalização e mecanização da produção, os
holandeses construíram uma vasta frota - superior em marinheiros (na sua grande
maioria estrangeiros, na época considerados a escória dos trabalhadores) às da
França, Inglaterra, Espanha e Escócia em conjunto -, que lhes permitiu obter
grandes lucros no comércio mundial que desenvolveu, sobretudo na Ásia, através
da Companhia Holandesa das Índias Orientais, e na América latina. Para a
difusão deste comércio contribuiu decisivamente o poderoso Banco de Amesterdão com
a criação do florim branco, recebendo depósitos, efetuando pagamentos em
divisas e concedendo créditos, à cidade de Amesterdão, à Companhia das Índias e,
por fim, às empresas privadas. Na segunda metade do século XVII, as sucessivas
guerras - com Inglaterra em 1652/54; 1665/1667; 1672/74, com a França em 1672,
e sobretudo a da Sucessão de Espanha - 1702/14- e o consequente endividamento,
conduzem ao enfraquecimento da economia holandesa e à perda da sua
predominância.
A supremacia do poder marítimo
e colonial da Inglaterra face à Espanha e à Holanda nos séculos XVI e XVII,
permitiu decuplicar o seu comércio externo de 1610 a 1640, desenvolvendo uma
poderosa burguesia associada à miríade de mercadores, artesãos e assalariados,
que produziam e transacionavam têxteis, aço, papel, alúmen, hulha e manufaturas
diversas. Para o sucesso da expansão comercial inglesa contribuiu decisivamente
a Companhia das Índias Orientais, fundada em 1600 pela rainha Vitória, que
estabeleceu feitorias nos locais mais recônditos do império, bem como a aliança
entre a alta burguesia e o Estado, caracterizada pelo engrandecimento nacional
e enriquecimento de ambos, cujos negócios, este, protegia, através de
regulamentação económica e fiscal. Tal não impediu a decapitação de Carlos I,
em 1649, pela infeliz ideia de decretar o aumento dos impostos sem
consentimento Parlamentar e com isso provocar a ira popular, dando origem à
ascensão da república oligárquica que Cromwell rapidamente converteu em
ditadura. Partidário do mercantilismo, Cromwell impôs a exclusividade do
transporte marítimo à frotas inglesa ou coloniais, bem como os marinheiros
ingleses às mesmas, em, pelo menos, três quartos do total.
A economia inglesa,
predominantemente rural, abalada por nova vaga de enclosures - extensas áreas retiradas à atividade agrícola para uso
exclusivo de pastagens de ovelha -, gerou novos contingentes de camponeses sem
terra e a reativação do descontentamento popular que culminou com a exigência
de democracia parlamentar, liberdade e propriedade que, justamente, constituíam
as aspirações dos camponeses médios e abastados, artesãos, comerciantes e
notáveis locais. A estratificação socioeconómica é extensa e a diferenciação
salarial oscila entre as 6,1 libras anuais para cada família de camponeses
pobres - 400000 - e as 2590 para cada uma dos lordes - 186 -, sem contar com os
vagabundos – 30000 pessoas – que auferiam 2 libras anuais! Aumento salarial,
redução do horário de trabalho e proteção contra a concorrência estrangeira era
o que artesãos pobres, operários e negociantes-fabricantes exigiam da
regulamentação estatal, em vez de democracia e liberdade.
Em 1689, na sequência do
descontentamento popular liderado pela alta burguesia, banqueiros,
profissionais liberais, grandes camponeses e comerciantes, que reclamavam
democracia e liberdade, forçando o exílio de Jaime II, o Parlamento oferece a
coroa de Inglaterra a Guilherme mediante o compromisso de, este, respeitar a
célebre “Declaration of Rights” que
impedia o Rei de suspender a aplicação das leis, de receber impostos e de recrutar
e manter um exército em tempo de paz sem o consentimento do Parlamento. A
extinção do absolutismo, em que a Inglaterra foi pioneira, não deu lugar à
democracia, uma vez que apenas cerca de cinquenta mil proprietários tinham
direito a nomear representantes no parlamento. Aliados do lado do povo no
condicionamento do poder régio, as novas elites mudam de estratégia e estabelecem
um compromisso com a nobreza.
Com o seu Leviatan , publicado em 1651, Locke
rebate as teses absolutistas de Hobbes defendendo
a livre adesão dos cidadãos como legitimação da sociedade e o direito de insurreição;
Em consequência, cada vez que o
legislador ataca os bens que pertencem ao povo e o prejudica, cada vez que
procura escravizar o povo impondo-lhe um poder arbitrário, entra em guerra com
ele. Paradoxalmente, ou nem tanto, Locke, originário de famílias abastadas,
médico, com experiência de administração pública, tendo viajado por França e
Holanda, não reconhece aos trabalhadores capacidade para governar, preconizando
o uso da força para os pobres. Aos vagabundos válidos - entre os 14 e os 50
anos -, condenava a servir três anos na frota, aos que vivessem junto ao mar,
aos restantes teriam que trabalhar três anos nas Workhouse - casas de trabalho comunal. Os que tivessem menos de 14
anos condenava-os a serem chicoteados e obrigados a frequentar uma escola de
ofícios. Para Locke, os homens com direito ao contrato social são os membros da
nobreza, do clero, da gentry e da
burguesia comercial e financeira.
O liberalismo surge pela pena de Sir Dudley North, admirador de
Descartes, na sua obra Discourses Upon Trade publicada em
1691;…Nunca nenhum povo enriqueceu por intervenção
do Estado, mas é a paz, a indústria, a liberdade e nada mais que atraem o
comércio e a riqueza.
O banco de Inglaterra, fundado em
1694 e os tratados de Methuen - com Portugal em 1703 - e de Utrecht - com a
Espanha em 1713 -, abrindo aos ingleses os mercados da américa do sul, expandiram e consolidaram o domínio da
economia mundial pelos ingleses, que só viriam a perder para os americanos no
decurso da primeira guerra mundial.
(Continua)
(Síntese livre a partir da obra de Michel Beaud; A História do Capitalismo)
(Síntese livre a partir da obra de Michel Beaud; A História do Capitalismo)
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