Olhando Para Dentro
1930-1960
(Bruno Cardoso Reis)
(Em História Política
Contemporânea, Portugal 1808-2000, Maphre - notas)
A segunda consolidação do regime
(1949-1958):
No auge da Guerra Fria, com os regimes ibéricos considerados aliados na
luta da Europa Ocidental contra a expansão do comunismo, a oposição ficou sem
apoios externos; a União Soviética, demasiado distante, suscitava reservas nos
setores moderados. Na frente interna, as sucessivas depurações, decorrentes das
várias tentativas golpistas do pós-guerra, e a renovação geracional, retiraram
à oposição os apoios que detinha no seio da Forças Armadas.
Com a oposição dividida o PCP assumiu a liderança oposicionista -
estratégia que seguia desde o fim da II GM - fundando, em 1949, o Movimento
Democrático Nacional (MDN) dirigido por Rui Luís Gomes - prestigiado professor
universitário saneado em 1947 por razões políticas.
Os setores oposicionistas moderados - demoliberais e pró-ocidentais -
organizaram-se num Diretório Democrático-Social liderado por António Sérgio e
Mário de Azevedo Gomes.
Enquanto a oposição comunista se afirmava nacionalista (curioso!) a
oposição atlantista reclamava para si o propósito eminentemente social.
É neste contexto que Salazar se depara com a encruzilhada política
resultante do falecimento do Marechal Carmona, Presidente das República desde
1928, apoiante decisivo de Salazar nos primeiros anos. Consta, segundo
testemunho em Tribunal dos intervenientes, que foi o inspirador do golpe
militar abortado de 1947 designado por “abrilada”.
As hostes salazaristas agitaram-se dividindo-se em várias fações;
republicanos e monárquicos, católicos e laicos e modernizadores e
conservadores. Mário Figueiredo pelos monárquicos, Marcello Caetano pelos
modernizadores e Santos Costa pelos ultraconservadores foram as figuras que
mais se destacaram.
Mário Figueiredo, companheiro de Salazar dos tempos do seminário, líder
da Assembleia Nacional, propôs a acumulação das funções de Presidente do
Conselho e da República por Salazar até ser designado o herdeiro ao trono, com
a finalidade de restauração da monarquia, seguindo a linha tradicionalista
conservadora, à semelhança do que Franco tentara em Espanha.
Opondo-se a esta solução, Marcelo Caetano defendeu, no âmbito do
reconhecimento do Estado Novo, a legitimação popular do regime republicano e a
candidatura de Salazar a Chefe de Estado, abrindo espaço à sua substituição na
chefia do Governo e à renovação e maior institucionalização do regime,
modernizando-o controladamente. Caetano, um dos candidatos naturais à sucessão de
Salazar, assumiu um discurso de adesão ao salazarismo na apresentação das suas
propostas esperando, assim, obter o apoio popular.
A terceira opção, a que foi seguida, foi protagonizada pelo líder da
ala militar do regime e figura de proa do salazarismo, Santos Costa. Monárquico
e católico, Santos Costa recusou a restauração da monarquia alegando falta de
apoio do setor militar e propôs a nomeação dum civil para o cargo de Presidente
da República. Ante a insistência de Salazar na manutenção do formato, foi
Santos Costa que, a seu pedido, indicou o sucessor de Óscar Carmona, o general
Craveiro Lopes, comandante da Legião Portuguesa. Este, porém, era uma segunda
escolha. A primeira recaíra no general Afonso Botelho, comandante da Guarda
Nacional Republicana (GNR), que recusou.
Por ocasião das eleições presidenciais em 1951, a oposição, dividida,
apresentou dois candidatos; os atlantistas avançaram com o Almirante Quintão
Meireles, um dissidente do regime, católico, “português de lei”, por isso
insuscetível de ser visto como simpatizante do comunismo. Porém,
descredibilizou-se perante a oposição ao afirmar-se fiel à pureza dos ideais do
28 de Maio, no qual participou, apesar de, infrutiferamente, ter apelado à
dissidência nas fileiras situacionistas. O indiciado candidato da linha
pró-comunista, professor Rui Luís Gomes, foi considerado inapto pelo Conselho
de Estado, acabando por se juntar, no Brasil, a uma importante comunidade
oposicionista exilada.
Os sete anos seguintes, sob a égide do anticomunismo, foram de acalmia
e algum progresso económico e na educação. Porém, algumas brechas começaram a
surgir; na Igreja Católica, nas Forças Armadas e no Império Colonial.
Do lado católico, os jovens, cada vez mais críticos com o regime,
foram-se afastando, chegando algumas das suas publicações a ser proibidas a
partir de 1953. As causas radicam em dois fatores, o primeiro dos quais no
facto de não terem vivenciado o anticlericalismo da primeira república e o
segundo, na grande renovação católica resultante do Concílio Vaticano II (1962
a 1965). Por outro lado, a participação crescente dos católicos em reuniões
internacionais numa Europa solidamente democratizada, ajudou a mudar
comportamentos no seio da congregação.
Do lado das Forças Armadas, a sua modernização, no âmbito dos programas
da NATO, conduziu à participação de jovens oficiais em cursos de formação e no
comando de operações militares, familiarizando-os com as democracias
ocidentais, ordeiras e prósperas, enquanto, simultaneamente, os manteve afastados
da política interna.
Finalmente, no Império Colonial, o aumento da procura internacional
pelos produtos coloniais resultante do investimento efetuado, provocou o
aumento do peso do trabalho e das culturas obrigatórias. Por outro lado, a
aposta na formação das populações africanas resultou no acesso de muitos jovens
negros e mestiços ao ensino superior, em Portugal ou no estrangeiro,
financiados pelo Estado ou pelas missões.
Assim, em 1944, com o intuito de unir os estudantes africanos em torno
do Império, foi criada a Casa do Império, que viria a produzir, ironicamente, o
efeito contrário. De facto ali se formou o Movimento Anticolonial (MAC); dali
saíram alguns dos principais líderes independentistas; Amílcar Cabral,
Agostinho Neto e Marcelino dos Santos.
Em resumo; com elites africanas mais educadas e com a economia colonial
internacionalizada, surgiu um maior contacto dos africanos com a realidade fora
de África e um maior desejo de libertação.
António Sérgio
Craveiro Lopes
Quintão Meireles
Mário de Figueiredo
Peniche, 6 de Junho de 2020
António Barreto
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