Olhando Para Dentro
1930-1960
(Bruno Cardoso Reis)
(Em História Política Contemporânea, Portugal 1808-2000, Maphre - notas)
Peniche, 6 de Junho de 2020
António Barreto
Salazar e um grande Portugal: das colónias ao ultramar sem mudar nada
de essencial:
Dada a dimensão do Império Colonial
Português - o terceiro maior à época (em extensão) -, as colónias desempenharam
um papel fulcral na consolidação do poder, fortemente nacionalista, de Salazar.
As crises de 1930 e 1961, - na primeira, Salazar
foi acusado de falta de empenho na preservação das colónias e na segunda, de as
não querer alienar -, tendo feito abanar o regime, acabaram por reforçá-lo.
Salazar, acusado em 1930 de querer
“sacrificar o império no altar da austeridade” - em consequência das
declarações de Quirino de Jesus - seu mentor nos primeiros anos de vida
política -, nas quais referiu o prejuízo económico das possessões ultramarinas
-, empenhou-se no saneamento financeiro, na centralização do poder e na
“nacionalização” das colónias.
Durante os cerca de seis meses de 1930, em
que foi ministro interino das colónias, Salazar infletiu a política seguida na
Primeira República, caracterizada por uma crescente autonomia dos governadores
coloniais então designados por altos-comissários.
Aos colonos foi negada qualquer autonomia e
impostas culturas obrigatórias. Por outro lado, foram-lhes garantidas quotas de
mercado na Metrópole e trabalho forçado nas suas explorações.
À crescente pressão internacional, promovida
pela Sociedade das Nações, pela Organização Internacional do Trabalho e, mais
tarde, pela Organização das Nações Unidas, respondeu Salazar com alterações
pontuais e uma tenaz diplomacia de resistência, através de Armindo Monteiro,
seu primeiro ministro das colónias.
Depois de 1945, reagindo à mudança de
contexto externo, Salazar consentiu a Marcelo Caetano - seu segundo ministro
das colónias - uma reforma descentralizadora, que, afinal, se restringiu a
aspetos menores, nunca pondo em causa o centralismo da Metrópole. Criaram-se os
Conselhos Legislativos, integrando, numa primeira fase, colonos, e, mais tarde,
negros e mestiços, corporizando o multirracialismo doutrinário.
Porém, o Código do Indigenato de 1928 mantinha
excluída da cidadania uma grande parte da população (note-se que, Marcello
Caetano, justificava esse Código com a necessidade de proteger os indígenas do
interior do choque cultural das cidades - ver em Depoimento).
Apesar de alguma preocupação de Salazar com
os excessos do trabalho forçado nas Colónias, a dissidência de Henrique Galvão
decorreu da passividade daquele ante as conclusões do seu relatório enquanto
Inspetor, que culminou com violenta denúncia numa reunião secreta (?) da União
Nacional (tal marcaria o início do fim do estado de graça de Galvão junto de
Salazar, apesar deste ter discordado do afastamento daquele da UN).
(O desenvolvimento desta oposição culminou
com o sequestro do Santa Maria, uma espécie introdução à tentativa de golpe de
Botelho Moniz e do início da guerra em Angola, em 1961).
De assinalar que, na reforma de 1951,
retomando o tema levantado em 1930 por altura do Ato Colonial, se alterou a
terminologia das “possessões” ultramarinas, tendo-se substituído a designação
de Império por Ultramar e de Colónias por Províncias.
(Tal decorreu de uma resolução da ONU
exigindo que os seus associados declarassem formalmente a existência ou não de
“Povos não autónomos” nos seus territórios, a fim de, em caso afirmativo,
implementarem programas de desenvolvimento das respetivas populações com
garantia de autodeterminação. A alteração constitucional efetuada por Salazar
permitiu-lhe sustentar, juridicamente, a tese da unidade política e
administrativa do país e consequente inexistência de “povos não autónomos”. Só depois
de 1945, a ONU, devido à teimosia de Salazar avançar com reformas em África,
passou a considerar as “possessões” portuguesas como Colónias alvo de
exigências específicas. Até aí considerava o caso português diferente dos restantes.
E era.)
Marcello Caetano e Sarmento Rodrigues
implementaram um conjunto de reformas de cariz tecnocrático nas Províncias
Ultramarinas com o propósito de fomentar o seu desenvolvimento económico. O
fomento Ultramarino subiu à categoria de Subsecretaria de Estado, foi criado o
Instituto superior Colonial e múltiplos organismos técnicos especializados
desde a medicina à agricultura.
Porém, nenhuma reforma descentralizadora foi
introduzida. Pelo contrário, em 1959, (ano da Revolta da Sé e um ano após o
caso da candidatura presidencial de Humberto Delgado), prevendo as revoltas
nacionalistas, foi criado o Gabinete de Negócios Políticos com a missão de
coordenar as ações dos Ministérios da Defesa, dos Negócios Estrangeiros e do
Ultramar, na defesa das Províncias Ultramarinas.
As crescentes críticas internacionais, lideradas
pela ONU, encorajaram as insurreições nacionalistas em Angola no ano de 1961;
levantamento contra a cultura forçada do algodão no Leste ataque às prisões de
Luanda (São Paulo) em Fevereiro e insurreição armada no norte, em Março (ataque
terrorista da UPA - União dos Povos de Angola - que vitimou cerca de 1500
pessoas entre brancos e negros).
Adriano Moreira, Ministro do Ultramar em
1961, procurou implementar a sua política de “autonomia progressiva e
irreversível”, determinando o fim do trabalho forçado, das culturas
obrigatórias e do Estatuto do Indigenato. Procurava-se, assim, eliminar as
fontes de descontentamento interno e esvaziar os protestos externos eliminando
os apoios aos movimentos independentistas.
A ser levado à prática, o projeto de Adriano
Moreira enfraqueceria o poder de Salazar e, com a independência das Províncias
Ultramarinas, conduziria Portugal à irrelevância internacional. Contrariamente
a outros países colonizadores, como a Grã-Bretanha e França, Portugal não dispunha
de meios que lhe permitissem praticar o neocolonialismo (o que ainda ocorre em
muitas ex-colónias).
Finalmente, como reconheceu Almeida Santos,
em 1961 Salazar tinha o povo e alguns dos seus mais prestigiados adversários do
seu lado. A descolonização significaria o seu suicídio político (engraçado este
raciocínio, focado no poder de Salazar e não na legitimação desse poder pela
vontade do povo na questão colonial) e contrariaria a sua política
nacionalista.
Henrique Galvão
Adriano Moreira
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