25 de Abril em 2024
Poucos sabiam o que estava a
suceder. Percebeu-se a queda
do regime quando correu a notícia do sequestro de Marcelo Caetano no
quartel do Carmo. A dúvida e o medo, entre a população, atenuou-se
com a passagem simbólica do poder para o General Spínola, cuja fama
de guerreiro e patriota se instalara entre a população.
Anunciou-se
a Liberdade, simbolizada nos
cravos vermelhos; o fim de
todos os constrangimentos coletivos e pessoais. Tudo
parecia possível! Uma onda de esperança varreu o país de lés a
lés; os mais céticos
rendiam-se, ao novo
desígnio.
O
espaço mediático inundou-se de canções esperançosas, cujas
estrofes ainda povoam o imaginário de quem as ouviu; “E Depois do
Adeus”, um convite à reflexão metafísica; “Grândola Vila
Morena”, o paradigma do poder popular; “ Liberdade”
onde o autor, a certo passo, em jeito de promessa e aviso, diz que
não há liberdade a sério enquanto não houver, a paz, pão,
habitação, saúde, e educação para o povo.
Tudo
o que tinha sido negado pelo anterior regime seria uma realidade
futura, graças à instauração de qualquer coisa que ainda não
sabia bem o que era.
Nesta ideia radicava a
esperança, reiterada, sucessivamente, pelos novos protagonistas
político-militares do país e pelos encómios internacionais ao
êxito da Revolução”. Uma ideia, cega, indefinida, abstrata, mas
real, que calou bem no coração dos portugueses.
A
esperança deu
lugar à euforia e esta ao desvario; com o incentivo e participação
de ativistas políticos desarticulou-se a administração pública e
o aparelho económico; ocuparam-se repartições,
empresas e propriedades
agrícolas e urbanas.
Paralisaram-se
escolas, universidade e
empresas - muitas
das quais entraram e autogestão e
falência -, a
anarquia instalou-se nos
transportes públicos.
Insegurança,
incerteza e
turbulência social,
instalaram-se no
país. Por
toda a parte velhos
ressentimentos pessoais, sob o
pretexto de
“justiça social”
clamavam por vingança.
Era
o tempo dos saneamentos, da caça aos “fascistas” - os
novos “hereges” -, das
denúncias e prisões arbitrárias, dos
mandatos de prisão assinados em branco pelo “herói” do momento,
o estratega” do golpe militar, o futuro alegado mentor e fundador
do grupo terrorista conhecido por FP25.
Finalmente,
53
anos após a fundação do seu partido, os comunistas portugueses
tinham a sua revolução Leninista, cuja
simbologia se apressaram a
imitar; a chegada triunfal à
estação de Santa Apolónia e a a comemoração da vitória em cima
de uma chaimite.
O
reconhecimento do
direito dos dos
povos à autodeterminação, consignado no Programa do M.F.A, foi
transformado, pelos
proeminentes dirigentes partidários e militares da época,
em reconhecimento do direito
dos povos à
autodeterminação e independência.
A
prometida e “indispensável”
consulta às respetivas populações ou aos
seus “indiscutíveis”
representantes foi considerada desnecessária pelo eminente jurista,
ex-Secretário de Estado de Salazar, chefe do partido mais perseguido
e violentado da época, considerado, então, e atualmente, fascista;
Freitas do Amaral.
Para
a negociação dos
“indiscutíveis representantes” dos povos, foram, não eleitos, à
boa maneira democrática, mas, segundo
o método Estalinista,
designados
pelos novos protagonistas político-militares, entre os dirigentes
dos grupos de guerrilheiros em
confronto militar com Portugal. E quando os não houve,
“inventaram-se” como foram os casos de São Tomé e de Timor.
O
mesmo “eminente jurista” - que, mais tarde, então
Vice-Presidente dum
Governo Provisório, ante a
queixa de alta-traição, apresentada em Tribunal, contra aos
principais agentes da ”descolonização
exemplar”, declararia que a classe política - ou o Governo -,
jamais consentiria num julgamento, que só à História caberia fazer
-,
contra a expetativa das promessas do M F.A e de
outros
políticos (Almeida Santos) - de respeito pela vontade das populações
-, perante
a estupefação dos próprios militares, declarou,
do “alto da sua cátedra” e da sua “imensa” cultura
democrática, desnecessário esperar pelas eleições para avançar
com a descolonização.
E
esta fez-se, entregando “de mão-beijada”, após um simulacro de
negociações - em Lusaka,
em
Alvor e em Argel -, os territórios ultramarinos, num ambiente de
humilhação para o Governo de Portugal e de vexame para as FAP.
Desnacionalizaram-se
centenas
de milhar de
portugueses transformando-os
em párias. Abandonaram-se
as populações
à sua sorte, desarmando-as e
ordenando a passividade das Forças Armadas - que, de braços
cruzados, assistiram aos massacres e enxovalhos de Portugal e dos
portugueses. Recorreu-se ao eufemismo Retornados para esconder a
verdadeira condição de Refugiados
dos que tiveram que fugir à
morte, abandonando décadas de trabalho.
A
prova de que o respeito pela vontade das populações nunca esteve no
horizonte dos líderes políticos de então, está
no
caso de Timor, em que a respetiva população foi abandonada, apesar
de, reiteradamente, ter afirmado a vontade de continuar a viver sob a
bandeira das quinas.
Quem
pode orgulhar-se disto? O
Mário Soares!
“Em
defesa da pátria do ultramar, entre Março de 1961 e Abril de 1974,
morreram 4788 portugueses de todas as cores e raças, enquanto que na
Grande Guerra (e nas duas frentes) morreram 7908 (do livro A Vitória
Traída)”
“
E com a “descolonização exemplar”? Não está feita a
estatística, mas só em Timor
se fala em 90000! E em
Angola mais de 100000!”
“Houve
largas centenas de milhares de mortos e de vítimas de violações e
torturas!...e cerca de milhões de refugiados!”
“Segundo
O Tempo
de 4/3/76, o país gastou 178 milhões de contos em defesa do
Ultramar
e e
despendeu 172 milhões de contos com a sua entrega - e só até
àquela data!”
“Segundo
Pompílio da Cruz, no livro Angola
- Os Vivos e os Mortos…, os
portugueses deixaram em Angola, em investimentos privados e públicos,
1 bilião e duzentos milhões de contos! Com Moçambique e o restante
Ultramar, a perda rondará os 2
biliões de contos!
“Guiné:
centenas de “comandos” fulas foram desarmados e entregues ao
PAIGC, sabendo-se perfeitamente que iam ser trucidados por terem
defendido a pátria comum, sob
o
comando de Carlos Fabião – o próprio que, depois, os entregou à
morte, sendo Encarregado do Governo.”
“Angola:
Ainda a província era Portugal e já estava ocupada por soldados
cubanos….A independência deu-se a 11 de Novembro de 1975 e no
Verão desse ano o exército cubano desembarcou em Angola. Quem
autorizou esse desembarque? Quem autorizou que os aviões escalassem
as Lajes? Quais os responsáveis que colaboraram com os cubanos e os
apoiaram? Costa Gomes negou o facto numa entrevista – mas O
Diabo
replicou: “Costa Gomes mente”.
“Moçambique:
Disse Samora Machel em Nampula ainda antes da independência:
“Enfrentamos generais portugueses corajosos como Caeiro Carrasco e
Kaúlza de Arriaga”, que nos teriam derrotado. Mas, não queremos
em Moçambique depois da independência, esses oficiais e soldados
que se renderam cobardemente, nem sequer defenderam aquilo porque
morreram tantos dos seus.”
“Com
a coragem que é seu apanágio, o prof. António
José Saraiva
escreveu num artigo publicado no Diário
de Notícias
em 26/1/79:
“Os
militares, sem nenhum motivo para isso, fugiram como pardais,
largando armas e calçado, abandonando portugueses e africanos que
confiavam neles. Foi a maior vergonha de que há memória depois de
Alcácer Quibir.””
É
disto de que devemos orgulhar-nos no 25
de Abril?
E
Hoje?
Temos
eleições por sufrágio direto e universal - o
lado bom - num modelo
representativo que favorece os maiores partidos, a
liberdade de expressão condicionada
mercê de subterfúgios
vários, a liberdade de acesso às profissões e de mobilidade
espacial
cada vez mais restrita, o aparelho judicial disfuncional, onde a
promiscuidade salta
à vista, a população refém das corporações de que depende o
Estado Social, uma Administração Pública paralisante e insaciável
devoradora de recursos, uma
dívida pública e privada comprometedora do desenvolvimento futuro,
uma classe política que reserva os melhores cargos públicos para os
seus e uma população angustiada com sucessivos e sobrepostos
complexos de culpa; políticos, ambientais, coloniais, económicos,
sanitários, etc. etc.
Quanto
aos slogans de Abril, 50
anos depois:
“A
Paz”: Não havendo já guerra colonial vivemos em permanente
estado de quase guerra civil, com
o nosso modo de vida ameaçado, não
se podendo, pois,
afirmar, que alcançámos a paz.
“O
Pão”: Com cerca de dois milhões de pobres e outros
tantos
no limiar de pobreza, há demasiada gente com fome.
“Habitação”:
Seja por arrendamento, seja por aquisição de casa própria, está
cada vez mais inacessível ao comum dos cidadãos, asfixiado em
impostos, num contexto de perseguição aos proprietários e
agravamento contínuo dos custos de construção.
“Saúde”:
Gratuita e acessível a todos, de
Jure, mas
não de facto,
com os mais pobres resignados ao SNS, e os restantes compelidos a
subscreverem planos de saúde privados.
“Educação”:
à massificação do ensino sucedeu a degradação da qualidade do
mesmo e a escassez de empregos no setor privado, esmagado por insana
regulamentação, e condicionada pelo preconceito e pesada
fiscalidade.
Tudo
isto num contexto de regressão demográfica - em que a taxa de
reposição é muito inferior é
necessária para manutenção
do
contingente populacional atual -, de elevada taxa de emigração, que
só encontra paralelo nos anos 60 do século XX e no
século XIX, de
modulação cultural, com a introdução acelerada do “wokismo”
e
de negação dos valores cristãos - e
de
empobrecimento relativo do país face aos seus parceiros europeus.
Não
é séria a comparação do Portugal de hoje com o de há 50 anos,
cuja economia, desde os anos 50, crescia a ritmo galopante -
incluindo as das províncias ultramarinas, em especial de Angola e de
Moçambique.
Ninguém,
honestamente, é capaz de dizer que o país ficaria, económica e
politicamente estagnado. e que a integração europeia não seria uma
realidade. Afinal,
o
processo de adaptação das economias do espaço português -
metrópole e ultramar - era objeto de negociação com a CEE.
Para
cumprir Abril, falta-nos mais democracia, mais desenvolvimento e mais
liberdade, o que só é possível com partidos, políticos e
corporações vinculados ao interesse nacional
e sem os
privilégios próprios do Antigo Regime.
Créditos:
-
Os Descolonizadores e o Crime de Alta Traição à Pátria. Ulisseia.
Silvino Silvério Marques, Luís Aguiar e Gilberto Santos e Castro.
-
Livro
negro do 25 de Abrol – FP editor. José Dias de Almeida da Fonseca.
Citações.
-
As Causas do Atraso Português – D. Quixote. Nuno Palma.
Peniche,
25 de Abril de 2024
António
Barreto