Inflação
(Considerações por um não economista)
A Inflação consiste no aumento geral de preços dos bens. Numa economia
liberal - onde os preços são definidos pelo livre mercado -, a inflação estabelece-se
automaticamente refletindo, a cada momento, o diferencial da evolução entre a
oferta e a procura de bens e serviços; em linguagem matemática, a inflação varia
proporcionalmente à relação entre as derivadas da procura e da oferta; em
linguagem corrente, a inflação aumenta quando a procura aumenta mais do que a
oferta e diminui no caso contrário.
A inflação é um parâmetro importante na monitorização da evolução
económica e é, por isso, objeto da atenção dos bancos centrais que, dotados de
plenos poderes, procuram mantê-la em níveis considerados economicamente e
socialmente sustentáveis - atualmente, em torno de 2 %, na Europa e nos EUA -,
dispondo para o efeito, e em exclusivo, de poderosos instrumentos; definição
das taxas de juro de financiamento bancário e regulação da quantidade de moeda
em circulação - quantative easing.
Os economistas dizem que a inflação é um imposto escondido; e têm razão,
uma vez que o aumento de preços sem correspondência no aumento dos salários
reduz o valor dos salários reais. A inflação é, afinal, um mecanismo automático
de ajustamento económico.
As causas da inflação são várias; conjunturais, estruturais, internas e
externas. A enorme inflação atual é geral e resulta de uma sobreposição de causas
externas, aparentemente conjunturais.
A redução da oferta de gás natural e petróleo no mercado internacional,
resultante das sanções económicas que os países Ocidentais aplicaram à
República Federativa Russa, fez aumentar o preço do principal fator de
produção, a energia, causa imediata do aumento geral dos preços.
Esta é uma causa aparentemente conjuntural; em princípio cessará com o
termo do conflito militar em curso na Ucrânia, no pressuposto de que o desenlace
desta tragédia se traduza na mudança de regime político na Rússia para outro
aceite pela comunidade internacional.
No entanto, o aumento do custo da energia na Europa já se verificava devido
à política ambiental em curso - causa estrutural -, que se traduz na redução da
oferta decorrente do fecho das centrais e na tributação das emissões de carbono.
De facto, as alternativas encontradas além de mais dispendiosas e insuficientes
- fontes renováveis - são demasiado voláteis - fontes de origem externa.
A crise energética sobrepôs-se a outras, decorrentes de dois anos de
crise sanitária; desde logo a forte redução da oferta resultante da disrupção
da atividade produtiva e das cadeias de distribuição, num contexto de explosão
geral da procura que se verificou com o abrandamento da crise sanitária. A
procura superou largamente a capacidade de oferta, pensando-se então que o
equilíbrio seria restabelecido meses depois. Causa conjuntural.
Há no entanto uma outra causa mais relevante que qualquer das
anteriores; o enorme aumento da quantidade de moeda em circulação que ocorreu
na economia mundial durante a crise sanitária. Perante a eminência de crises
sociais dramáticas resultantes do colapso produtivo que se adivinhava os
Governos decidiram subsidiar empresas e cidadãos recorrendo ao endividamento,
respaldados pelos respetivos bancos centrais que para o efeito se dispuseram a
fazer as emissões de moeda necessárias.
O acréscimo de moeda injetado nas economias destinou-se a compensar a
redução das respetivas atividades económicas, limitando a quebra dos
correspondentes PIB. O acréscimo de moeda não teve, pois, contrapartida do lado
da produção. Com a atenuação da crise sanitária e a recuperação económica subsequente
para os níveis pré-crise, emergiu a inflação.
O valor de uma moeda é definido
pelo valor da respetiva economia, ou seja, pelo valor total de bens que a sua
economia é capaz de produzir e transacionar. Para um mesmo produto - PIB - o valor
unitário da moeda diminui sempre que aumenta a quantidade de moeda em
circulação na respetiva economia. Foi o que sucedeu em quase todos os países -
exceto na China, creio -, incluindo na Europa.
Grosso modo, considerando apenas a EU, RU, EUA e Japão, cujo PIB agregado
deverá situar-se próximo dos 50 biliões de dólares, calculando, em média, 15 %
do PIB, o valor do acréscimo de moeda injetado nas economias respetivas - em geral
situou-se entre os 10 % - Portugal - e os
20% - Alemanha, EUA. Japão -, o aumento global de moeda terá sido algo como 7, 5
biliões de USD; o equivalente ao PIB agregado da Alemanha, França e Espanha.
No caso de Portugal, as políticas económicas introduzidas pelos Governos,
desde 2015, centradas no aumento da procura interna induzida pela reversão dos
cortes salariais e das pensões, e no aumento administrativo dos salários acima
da produtividade, geraram pressão inflacionista, a componente interna da
inflação.
Tendo em conta a marginalidade da economia lusa no âmbito da UE - cerca de
1,5 % do total -, onde vigora uma economia aberta plena, o impacto desta
componente na inflação geral, a meu ver é desprezível. O mesmo não sucede na
balança comercial de Portugal que voltou a ser deficitária depois de alguns
anos de excedente - 2013, 2014 e 2015.
“Em
economia, o ajustamento ocorre sempre”. Não falha! O aumento da procura sem
correspondência na oferta, gera inflação e consequente redução de salários. Como referi, as causas da inflação atual são
sobretudo externas, inevitáveis, e aparentemente conjunturais. A integração de
Portugal na UE dilui os efeitos inflacionistas resultantes do aumento da
procura pela tentadora - e demagógica - via administrativo dos aumentos
salariais, sem contrapartida do lado da oferta.
Porém, se quanto à inflação a economia portuguesa está relativamente
protegida de irresponsabilidades internas, o mesmo não sucede no âmbito
empresarial; sem capacidade de corresponder em matéria de produtividade, as
empresas nacionais soçobram e são substituídas por concorrentes externos.
Ao fecho das empresas sucede a escassez de empregos, a emigração da
população ativa, a redução da taxa de reposição populacional - negativa em
Portugal -, a desertificação do país, o crescimento do contingente público, o
recurso precipitado à imigração e o agravamento da carga fiscal.
A correção da inflação, inevitavelmente, passará por uma redução da
atividade económica geral, até se estabelecer o novo equilíbrio nos valores
considerados “economicamente saudáveis”, cerca de 2 %. Os instrumentos são os
mesmos, taxas de juro e financiamento – compra de dívida -, mas em sentido
inverso; aumento das taxas, restrições ao crédito e abandono progressivo da compra
de dívida pelos bancos centrais.
A correção dos efeitos das várias
crises, ocorridas e em curso, é, em si mesma, uma nova crise.
Não adianta esconde-lo.
Peniche, 16 de Abril de 2022
António Barreto
Sem comentários:
Enviar um comentário