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terça-feira, 5 de março de 2019

Humberto Delgado, O Mártir Socialista (notas, P14, última desta série)

Humberto Delgado, O Mártir Socialista
 
(Considerações com base nos livros; O Inimigo Nº 1 de Salazar de Paulo Jorge Castro; Acuso!, de Henrique Cerqueira; A Tirania Portuguesa, de Iva Delgado e outros) 
  
  
Avisado pelos seus próprios correligionários, recusando-se a trair quem o tinha traído - Lopes Ramos, Mário de Carvalho e outros -, HD, assumindo o risco da própria vida, foi ao encontro da morte, acreditando que, face às diligências que tomara, estaria a salvo.

    Quanto ao Governo de Salazar, avisado da iminência duma guerra civil, patrocinada pelo ex-candidato presidencial, estaria entre a espada e a parede, quer o assassinato quer a prisão constituiriam um embaraço suscetível de provocar danos na imagem externa do governo. Julgo porém que o propósito de Salazar seria o de deter HD, para submissão a julgamento; único procedimento internacionalmente aceitável. De todo o modo, ninguém poderá negar ao seu Governo o direito de impedir a invasão do território e de evitar uma guerra civil.

   A propósito, li por aí em local que de momento não recordo, que os assassinatos teriam sido fortuitos, Humberto Delgado, corajoso e frontal, mas desarmado, terá reagido às provocações dos agentes da PIDE, de que resultaram escaramuças que culminaram com o assassinato do General, por Casimiro Monteiro, e de Arajarir de Campos, por Agostinho Tienza. 

   Noutro plano, a estratégia de Delgado era suicidária; o General estava disposto a incendiar Portugal com uma guerra civil de consequências imprevisíveis, para derrubar o regime e ascender ao poder. Os horrores da guerra civil espanhola, bem como os da 2ª Guerra Mundial, pareciam não o impressionar. Neste aspeto, honra seja feita ao Partido Comunista que apostou num lento trabalho de consciencialização popular e na subversão dos organismos públicos. Por outro lado, Humberto Delgado demonstrou sempre uma postura autoritária junto dos colegas oposicionistas, impondo a todos a suas decisões, avesso à colegialidade, revelando-se intrinsecamente autoritário à semelhança do rival que pretendia derrubar.

   Quer relativamente a Henrique Galvão, quer relativamente a Humberto Delgado, há uma faceta omissa na retórica prevalecente no espaço público; a do patriotismo; ambos defendiam a integração de Portugal numa federação ibérica o que, quanto a mim, configura um ato de traição tendo em conta a gesta independentista de 9 séculos. Ressalve-se a recusa de Henrique Galvão da oferta da URSS de fornecimento de armamento - mísseis -, para afundamento do paquete Vera Cruz (de que fui tripulante), com 1500 militares a bordo. Recorde-se, a título de curiosidade, que o sequestro dos 32 tripulantes do navio costeiro Angoche, com posterior assassinato destes num campo de prisioneiros da Frelimo na Tanzânia, terá sido, supostamente, executado por forças navais da URSS, com a colaboração do Partido Comunista Português e, segundo consta, dalguns setores da Forças Armadas lusas em Moçambique.

   Hoje não restam dúvidas de que, num primeiro tempo, o grande vencedor da “Revolução” de Abril foi o PCP; com enorme retardo - 16 anos -, tudo se passou como planeara; um pronunciamento militar com adesão imediata do povo “consciencializado”.

      Num segundo tempo, o grande e definitivo vencedor, “ao sprint” foi Mário Soares; “correndo” na esteira de Delgado e Cunhal, resignado ao papel de parceiro de Cunhal, perante a prepotência política deste e o rumo antidemocrático que estava a ser imposto ao país, Mário Soares, com o seu PS, assumiu frontalmente a defesa da democracia com o que granjeou robusto apoio popular ratificado nas eleições constituintes de 1975 e legislativas, de 1976. De então para cá Portugal vive a “pax socialista”, onde os princípios programáticos do projeto de Humberto Delgado, defensor da democracia socialista, estão bem patentes no projeto socialista em curso.
Foto: Paquete Serpa Pinto, da CCN.

Peniche, 4 de Março de 2019
António Barreto

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